quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Episódio 9


Encontrou uma carta, com letras recortadas de revistas, e um boneco de pano de chapéu e uniforme.
- Meu Deus! Que brincadeira de mau gosto é essa? – surpreendeu-se Varre Tudo.
Antes mesmo de terminar a leitura da carta anônima, jogou a caixa em cima da cama e, com medo, saiu às pressas rumo à Prefeitura.
- Vou passar na Prefeitura antes de ir trabalhar. Se alguém quer me ver pelas costas, eu vou me garantir. É hoje que pego aquele documento e fico um pouco mais seguro. – ponderou, apressando o passo.
Durante o trajeto ficou pensando nas coisas estranhos e absurdas pelas quais passara nos últimos dias. Não entendia certas coisas, e por que tudo aquilo estava acontecendo com ele, justo ele, Altayr, um cara simples, de vida regrada e muitos sonhos. Enquanto pensava nisso, esqueceu-se por instantes da caixa e da carta anônima. Nem percebeu que saíra de casa sem comer nada e, quando a barriga roncou, parou no primeiro barzinho que viu.
- Um pastel de carne e uma xícara de café com leite, por favor. – disse, voz baixa e olhar atento.
- Pra viagem? – disse o senhor bigodudo e com camiseta física, do outro lado do balcão.
- Não, é pra comer aqui mesmo. O leite bem quente, tá?
- Sim, sim. Vou lá dentro preparar.
No instante em que Varre Tudo começou a folhear o jornal, como fazia todas as manhãs, viu pela vidraça do bar um vulto passando rapidamente. Quando se inclinou para ver melhor, enxergou o vulto entrar na cozinha, pela porta dos funcionários, que ficava do lado de fora do bar.
- Devo estar enxergando coisas. Só pode! Onde já se viu... Aquele dia foi na Árvore do enforcado, hoje de novo... Devo estar com mania de perseguição. – sussurrou tentando concentrar-se na leitura.
- Aqui está, moço, seu pastel. O café já vem porque o funcionário novo recém-chegou. Ele tá em experiência, mas o “gajo” é bom. Foi um vizinho meu, que é guarda municipal, que indicou ele pro serviço.
Ao ouvir as palavras ‘guarda municipal’, Varre Tudo lembrou-se logo de Juseppe, aquele “mala”. Riu baixinho.
- Aqui está, seu Varre Tudo. – disse o funcionário novo, olhando para o chão.
- Ué, como sabe meu nome? – surpreendeu-se.
- É, hum, arrr... todo mundo sabe, né! O senhor é famoso... – disfarçou o jovem atendente, sorrindo, enquanto recuava lentamente para trás do balcão até se enfiar na cozinha e não aparecer mais.
Varre Tudo, que já estava com a pulga atrás da orelha, resolveu não arriscar. Levantou-se, pagou e saiu apressadamente. Na mesa onde estava, ficou somente o jornal e a xícara de café, intocada.
Caminhou mais um pouco e chegou à Prefeitura. Quis apressar-se para não ter a infelicidade de encontrar dona Rosinha logo cedo. Pegou o envelope na sala indicada e saiu, sem nem conferir o conteúdo do mesmo.
Do lado de fora, o sol brilhava por entre as nuvens. Varre Tudo sabia que o dia seria muito bonito, um excelente dia de trabalho. Enquanto caminhava, sentiu um aperto no peito e teve a sensação de estar sendo seguido. Apressou o passo e parecia que alguém caminhava atrás dele, no mesmo ritmo, como se não o pudesse perder de vista.

Nenhum comentário: