quarta-feira, 31 de outubro de 2007

Episódio 39

Varre Tudo saiu caminhando lentamente pela cidade. Já era tarde e então decidiu apressar o passo, pois amanhã era outro dia e ele precisava descansar. Foi para casa e entrou direto para o banho.

Enquanto cantarolava, pensava na vida, em Magali, em Jaciara, e na conversa que tivera com Dona Arzelina. De repente, a campainha insistente atrapalhou seus pensamentos, e ele enrolou-se na toalha para ver quem era.

Ao abrir a porta, Varre Tudo corou.

- Oi Varre, tudo bem? Eu sei que é tarde, mas precisava falar contigo.

Parada do lado de fora, com o olhar entristecido, estava Jaciara.

- Jaci, desculpa, eu, eu... – disse Varre Tudo, sem saber o que fazer naquela situação embaraçosa.

- Entra, senta aí, vou me trocar e a gente já conversa.

Enquanto Varre Tudo se vestia, Jaciara ficou em pé, observando os porta-retratos na estante. Em anos de amizade com Varre Tudo jamais ficara a sós com ele, não conhecida suas histórias, seu passado. Pouco sabia de sua vida.

- Aceita um café? – disse, pegando a amiga desprevenida.

- Ui, que susto! Tava aqui vendo tuas fotos, teus livros. Quanta coisa legal! – disse, recuperando-se da entrada inesperada de Varre Tudo na sala.

- É, pois é, eu gosto de livros. Pena que nunca temos tempo de conversar sobre essas coisas. Mas já que esta aqui, aceita um café? – sugeriu Varre Tudo.

- Não, obrigada. Isso não é uma visita de cortesia. Vim falar contigo sobre minha vida, meus problemas. Tu é a única pessoa que posso confiar nesses últimos tempos. – desabafou Jaciara. – espero que possa me escutar.
Enquanto falava, Jaciara apertou o braço do amigo com força. Ele percebeu que não se tratava de nenhuma “frescura feminina”, mas sim de um assunto muito sério. Colocou um CD do Chico Buarque para tocar, e puxou a amiga para sentar-se ao seu lado no sofá.

- Vem Jaci, vem, senta aqui. Espero que você goste de Chico, me faz muito bem ouvir ele. Posso deixar tocando?

- Claro que sim, eu adoro. – disse Jaciara, que se calou a seguir. Foram os 30 segundos de silêncio mais demorados que Varre Tudo já passara em toda sua vida.

- Varre, tu tem sido um amigo muito bom. Nem sei o que seria de mim sem você nesses últimos dias. Tive uma decepção muito grande com o Juseppe, ainda não me recuperei direito do susto, e agora estou com muito medo de tudo. – falou, sem parar, enquanto mexia os braços e gesticulava.

- Ainda não entendo por que ele aprontou tudo aquilo contigo, quanta sacanagem, quanto ódio! – indignou-se Jaciara.

- Jaci, acontece que eu passei no concurso da guarda, e ele achou que eu ia pegar o lugar dele. Tu sabe como o Juseppe é cabeça dura, e como ele nunca gostou de mim, da minha amizade contigo... hoje eu vejo que ele queria era me prejudicar, mas espirrou pra todos os lados, inclusive em ti. – explicou-se Varre Tudo.

- Entendo, entendo, mas não acredito que eu namorava um cara tão mau caráter. Como eu pude ser tão burra? Tão estúpida... ele com todas aquelas promessas e eu, idiota, acreditava em tudo. – choramingou Jaciara.

- Não Jaci, por favor. Você é perfeita, linda, não há nenhum problema contigo. Tu não pode te culpar pelo Juseppe, ele não te merecia. Tu merece alguém que saiba valorizar o teu amor.

Mais uma vez o silêncio invadiu a sala. Debateu-se nos livros, na estante, e foi quebrado pela voz doce de Jaciara.

- Varre, eu to me sentindo estranha. Não consigo parar de pensar em ti, não sei o que ta acontecendo. Desde aquele dia na praça, quando o Jéferson me contou da gráfica e do envolvimento do Juseppe, as coisas começaram a se confundir dentro de mim.

Varre Tudo estremeceu. Queria dizer que também se sentia estranho, e que talvez tivesse um sentimento maior do que amizade por Jaciara, mas não quis se aproveitar da fragilidade daquele momento. Resolveu trocar de assunto.

- Jaci, eu também estou com muitas dúvidas. Não sei se deixo a COVAT e vou pra guarda. Penso no meu futuro, eu sei que mereço ir longe, mas depois de tudo que aconteceu eu percebo que somente do lado de vocês é que sou forte. E que a amizade de todos é que me faz ser um cara de sucesso. – sorriu Varre Tudo.

- Te entendo, mas as amizades podem terminar por uma razão ou outra. O teu futuro profissional é que está em jogo. Acredito nos teus argumentos e respeito eles, mas independente da tua escolha, pode ter certeza que estarei do teu lado. – disse Jaciara, secando a lágrima que teimava em cair.

- Que bom Jaci. Acho que minha decisão já esta tomada, mas prefiro não falar ainda. – explicou-se. Aproveitando o momento de troca de confidências, resolveu arriscar e apostou alto.

- Mas sobre aquele outro assunto Jaci... – disse, respirando fundo. – eu também sinto algo diferente por ti. Não sei explicar, mas às vezes tenho vontade de te ver toda hora, sinto falta do teu cheiro, da tua risada. Eu fico feliz quando estou contigo. – confessou.

Jaciara sorriu, apertando os olhos, e não disse nada. Varre entendeu aquele sorriso, e desviou o olhar para o chão. Quando voltou a fitar Jaciara nos olhos, os rostos se aproximaram até os lábios se tocarem, lentamente. Na sala, Chico cantava “deixe em paz meu coração/ que ele é um pote até aqui de mágoa/ e qualquer desatenção, faça não/ pode ser a gota d’água”. Abraçaram-se e acomodaram-se no sofá. Sentiram tanta paz que fecharam os olhos e Jaciara encostou a cabeça no peito de Varre Tudo, até ouvir seu coração bater acelerado. O cansaço chegou sem que percebessem, e os dois caíram no sono.

Episódio 38

A noite estava estrelada e a lua cheia tomava conta do céu com todo o seu esplendor. Varre Tudo caminhava lentamente com as mãos nos bolsos, pensando em Jaciara. Ele sentiu o vento brincando com seus cabelos e de repente o sorriso de Magali tomou conta de seus pensamentos. Varre pensou que seria bom passear a noite na beira do Rio dos Passos de mãos dadas com Magali, sentindo o perfume dela e contemplando seu sorriso lindo, ir ao cinema com ela e assistir os grandes clássicos, levar ela até o estádio e compartilhar a paixão pelo futebol. Ele se deu conta que há muito tempo não pensava em alguém assim e que talvez fosse a hora de dar uma chance para o destino. Varre continuou perdido em pensamentos, enquanto passava pela praça Pio X. A noite estava tão agradável e bonita que ele decidiu comprar um sorvete e sentar em um dos bancos para apreciar a lua. Varre nunca tinha namorado sério, estava sempre em casa estudando e cuidando de sua mãe. Lembrou das palavras dela: filho larga um pouco os livros, tem que sair, conhecer gente nova. Ele sorriu. Sua mãe como sempre estava certa. Ele sentiu saudades e um aperto no peito.

- Tô me sentindo tão sozinho! – suspirou.

Varre Tudo tinha dado prioridade aos estudos, e ainda queria realizar o sonho de se tornar Engenheiro Ambiental. Por isso estava tão confuso em deixar a COVAT. Sua vida estava ligada ao lixo, à varrição, à reciclagem e à conscientização. Varre acreditava que a educação ambiental, que tinha ganhado força e incentivo com a greve na cidade, era o primeiro passo. Mesmo assim, se sentia só e decidiu que ia convidar Magali para sair.

- Até que ponto vale a pena ficar sozinho? Vou mesmo dar uma chance ao destino! – pensou sorrindo.

Mas Varre sabia que antes disso precisava colocar a cabeça no lugar. Afinal, tinha que descobrir porque Jaciara não saía de sua cabeça, mesmo quando estava com Magali. Varre estava confuso, acreditava que a preocupação com a amiga era mais forte que a atração que sentia pela linda moça sapeca e tagarela. Ele continuava pensativo quando percebeu que do outro lado da praça uma equipe de garis limpava as escadarias da Igreja Nova Rita Santa com suas vassouras de pêlo. Varre nunca tinha notado como era mágico contemplar os detalhes dos uniformes da COVAT. Todos eles tinham tarjas que refletiam durante a noite para evitar acidentes. E apesar de conhecer tão bem aquele uniforme, ele ficou espantado enquanto acompanhava o movimento constante das vassouras em contraste com a luz da lua e os cabelos brilhosos das mulheres.

- É fascinante! – exclamou ele.

Garis varriam a cidade todas as noites, e as pessoas simplesmente passavam por elas como se nem as vissem. As mulheres desceram as escadas e passaram a limpar a calçada em frente à Igreja. Elas se moviam com delicadeza e graça, como se estivessem em um palco. Varre contemplava encantado aquele espetáculo. Elas dançavam com sensualidade e sincronia. Ele estava diante de um balé de vassouras. Sorria extasiado. O balé acontecia sempre em todas as ruas da cidade e ninguém parava para contemplá-lo. As moças limpavam cuidadosamente cada pedra histórica daquela calçada, sem nem se dar conta de como era lindo o espetáculo que produziam. Varre viu Magali em meio ao balé.

- Nossa! Ela é linda mesmo!

Ele queria contemplar o balé por mais tempo, mas elas já estavam se afastando em direção ao depósito da COVAT. Magali atravessou a praça e ele sorriu abertamente para ela. A moça sentiu que essa era a chance de conquistar Varre e ela não iria deixar passar.

- Oi Altayr! Tu veio me ver? – perguntou ela empolgada.

Varre corou! Ela era muito espontânea e ele super tímido.

- Tava indo pra casa, aí vi esse espetáculo. Quando varrem parece um balé de vassouras!

- Como tu é fofo! – disse ela, beijando a bochecha dele.

- Se tu diz. – falou sem graça.

Ela sorriu e deu a mão para ele. E os dois seguiram em direção da casa dela. Magali era tagarela, mas estava calada. Ela estava pensando que queria estar com Varre, mas também queria curtir as festas no fim de semana. Magali estava apaixonada, mas na verdade tinha medo. Ela sabia o quanto eram diferentes e Varre ainda não conhecia essas diferenças.

- O que tu tem? É sempre tão falante! – perguntou.

- Eu tava pensando. Tu sai bastante? Curte pagode, funk, música sertaneja?

- Não saio muito não! E curto mais rock.

- Ah, tu não iria comigo no baile funk? – pediu ela – enquanto dançava na frente dele.

- Talvez. Mas não sempre! Por quê?

- Olha só! Sou super direta! E te acho o cara mais fofo dessa cidade. Se preocupa com as pessoas, tem consciência e tudo mais. Tu tem noção que fez a cidade entrar em greve, tem liderança e não tem vergonha de trabalhar com o lixo. É o genro que minha mãe pediu a Deus!

- Pára Magali! Assim eu fico sem jeito! – corou ele.

- É verdade. Eu tenho vergonha de ser “lixeira”. Odeio usar esse uniforme e só não tirei esse trapo para vir pra casa, porque queria passar mais tempo contigo. – falou.

- Por que tem vergonha? Te falei que esse uniforme é lindo. Pareciam bailarinas!

- Fala sério! Eu só faço isso pra ter grana e curtir minhas festas. – disse ela, séria.

Varre pensou em Jaciara e mais do que depressa mudou de assunto:

- Magali, que tal a gente ir no cinema? Tá passando uma coletânea de filmes clássicos que marcaram a história do cinema? – pediu ele.

- Não gosto muito de filmes velhos. – disse ela.

- Então vamos para a Capital? A Feira do Livro está ótima, quero comprar algumas novidades em literatura infanto-juvenil sobre meio ambiente. O que acha? Passamos a tarde juntos. – perguntou empolgado.

- Aí, Altayr! Passar a tarde juntos! Adorei a idéia. Aproveito para comprar a biografia daquela funkeira, super famosa, como é mesmo o nome dela?

O celular de Magali tocou e, enquanto ela tagarelava com a amiga, combinado a festa do fim de semana, Varre Tudo a olhava atentamente. Ela era bonita e meiga, mas não tinham nada a ver um com o outro. Ela o abraçou e começou a falar da roupa que ia usar no baile funk. Eles chegaram a casa dela e ele esperou enquanto ela dava tchau para a amiga. Magali ficou na ponta dos pés para beijar os lábios de Varre Tudo, mas ele lhe deu um beijo na testa e a puxou para os seus braços. Varre a soltou depois de um longo e carinhoso abraço e sem dizer nada desceu as escadas. Ela entendeu e o olhou intensamente enquanto ele ia embora. Magali sabia que Varre Tudo jamais brincaria com os sentimentos dela. Ela também percebeu o que ele ainda não sabia. Não foram apenas as diferenças que tinham impedido aquele beijo. Os pensamentos e o amor de Varre Tudo eram dedicados à outra moça. Magali fechou a porta atrás de si, enquanto as lágrimas escorriam por sua linda face.

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Episódio 36


E voltou. As pessoas podiam deixar suas janelas abertas, pois não havia mais aquele cheiro terrível na cidade. A quantidade de insetos também foi reduzida e os ratos sumiram. O esforço e a união da população de Nova Rita Santa deixou a cidade limpa em exatos cinco dias. A limpeza foi feita principalmente pelo esforço de entidades sociais e das escolas. Depois do trabalho ter sido feito, os alunos ficaram muito curiosos querendo saber para onde era destinado todo aquele lixo:
- Profe! Se, em uma semana de greve, a cidade acumulou todo esse lixo, quanto será que a gente produz em uma ano?
- Caramba profe, onde vai parar todo o nosso lixo?
- Nossa! Eu sei que grande parte do lixo seco é reciclada e que o lixo orgânico é posto no aterro, lá no bairro São Cristóvão. Mas explicar o processo... eu não sei, não – disse Claudete, a professora.
Curiosa e prestativa em esclarecer corretamente as dúvidas de seus alunos da 7ª série, a professora aproveitou que a escola ficava pertinho do Parque dos Sabiás, onde ela sempre via os varredores, e foi até lá durante o recreio.
- Moço! Você pode me dar um minuto de atenção?
- Oi!? - respondeu Varre Tudo.
Varre Tudo deu todos os detalhes à educadora. Quando ela voltou para a escola entrou em contato com a COVAT e agendou uma visita à empresa para a manhã seguinte.
A folia no ônibus escolar era grande. Dia de passeio geralmente era assim. Chegaram primeiro à sede da COVAT. Mateus, o assessor da companhia atendeu os estudantes e disse que acompanharia o passeio pela Estrada do Lixo.
- Bom dia, pessoal! Como vocês já devem ter estudado, sabem que nosso município tem 296 mil habitantes, certo? Bem, todos os dias, nós produzimos 250 toneladas de resíduos. A maior parte, é de lixo orgânico, cerca de 210 toneladas. Esse lixo vai parar lá no Aterro Sanitário Municipal de São Cristóvão. O lixo seco, que é seelecionado, é distribuído gratuitamente para 10 associações de recicladores – explicou o Mateus.
Na sede da COVAT, os estudantes puderam ver como funciona o mecanismo dos caminhões que recolhem o lixo dos contêineres automaticamente. Viram também que os carros e caminhões da empresa são lavados com a água de uma açude do local.
Seguindo o passeio, o ônibus se dirigiu até a Associação dos Empregados pela Reciclagem. Ali, Jaciara explicou todo o processo, destacando que a entidade separava cerca de 5 toneladas de lixo por dia para, depois, vender. Os estudantes entravam tampando o nariz e se espantavam quando percebiam que não havia cheiro de lixo no local. Assim, entendiam que na reciclagem a maior pare do lixo era seco e não produzia odor.
O último ponto da Estrada do Lixo seria o aterro. Chegando lá, os estudantes conheceram Seu Roque e os sete cachorros que o acompanhavam durante o dia de trabalho. Aí, sim, começaram as caras feias para o mau-cheiro.
- Éca! Quanto Lixo! - reclamava um aluno.
- Apesar de vocês estarem pisando na grama, vocês não deixam de estar sobre uma montanha de lixo – destacou Mateus.
- Bécks! Que nojo! - reclamou outra aluna.
- Antes de o lixo chegar aqui, o terreno é preparado. É feito um isolamento com uma camada de argila e depois é colocada uma manta plástica, parecida com uma lona, é a geomembrana de pead. Esse “plástico” é formado por resinas virgens, que depois se integram à terra – instruía Mateus – Os caminhões descarregam o lixo, que chega a ter uma altura de quatro metros. O lixo é prensado com a ajuda das máquinas. Sobre o lixo vai mais uma camada de argila, outra de brita, outra de terra. Aí, a grama é plantada. O chorume, que é aquele liquido que sobra do lixo, é drenado para uma estação de tratamento.
- E o que é isso, que solta uma fumacinha? - perguntou uma estudante.
- Esses são os queimadores. Eles permitem que o biogás seja liberado e queimado. Todo dia, o Seu Roque passa pelo aterro para verificar se os 22 queimadores estão acesos.
Impressionadas com o processo, o cheiro e a quantidade de lixo, os adolescentes seguiram até o ônibus para retornar a escola. Muitas outras turmas passaram a conhecer a Estrada do Lixo. Na escola, todo lixo passou a ser separado corretamente.

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Episódio 35


Enquanto Abelhão, Shirley e Josias tentavam reanimar o amigo Varre Tudo, a quadrilha, formada por Catarina, Maurício, Capitão do Mato e Juseppe, embarcava nos carros da polícia. Todos seriam levados à delegacia, onde ficariam presos até que o caso do tráfico das aves, do incêndio dos contêineres e do seqüestro e da tentativa de homicídio de Jéferson fosse investigado e solucionado. Assim que Varre Tudo se recompôs do choque, seguiu com os amigos para o hospital Santa Lúcia, para onde a ambulância havia levado seu primo Jéferson. No caminho, o grupo de varredores, que seguia no mesmo carro, conversava sobre os últimos acontecimentos:
– Nossa, Varre Tudo! Quando teu primo entrou na sala de reuniões da prefeitura daquele jeito, todo machucado e queimado, eu levei o maior susto da minha vida! – disse Abelhão ao colega.
– Nem me fala, Abelhão! Tô muito preocupado com o Jéferson. E pensar que meu primo poderia ter morrido nas mãos daqueles desgraçados. Foi muita sorte ele ter conseguido se salvar. Se Deus quiser, ele ficará bom logo! – exclamou Varre Tudo.
– E quem diria que o Capitão do Mato estaria envolvido nessa história toda. Essa foi uma grande surpresa. – afirmou Josias. – Ele sempre foi rabugento e mal-educado com a gente, mas nunca imaginei que fosse capaz de participar uma coisa dessas. – completou o varredor.
­– É verdade, Josias! Agora começo a entender tudo que anda me acontecendo nas últimas semanas. Encontrar o Capitão do Mato, o Juseppe e mais o assaltante que me roubou a carteira no mesmo bando de criminosos explica muita coisa. Nem acreditei no que estava vendo quando reconheci os três lá na chácara. Foi uma grande surpresa. – disse Varre Tudo.
– Bom, pelo menos eles não vão mais incomodar a gente a partir de agora. E espero que eles recebam a condenação que merecem! – disse Shirley.
Varre Tudo e os colegas passaram poucos minutos no hospital. Somente queriam ter certeza de que Jéferson havia chegado bem e que se recuperaria dos ferimentos. Não podiam demorar, pois precisavam dar continuidade à reunião que decidiria o desfecho da greve. Por isso, Varre Tudo conversou rapidamente com o médico responsável por Jéferson.
– Seu primo não corre risco de vida, mas precisará permanecer no hospital por alguns dias para tratar as queimaduras que sofreu. – explicou o médico.
Varre Tudo nem chegou a entrar na sala onde o primo estava. Apenas observou-o através do vidro. Jéferson estava dormindo, e Varre Tudo achou melhor deixá-lo descansar. Em seguida, rumaram em direção à prefeitura. Um assunto muito importante ainda precisava ser resolvido.
Ao chegarem à sala de reuniões, foram recepcionados e amparados pelo prefeito Mostarda Moura, por Seu Pedroca e pelo presidente da COVAT, Manuel Vargas. Os varredores estranharam a solidariedade e a atenção que receberam. Assim que todos se acomodaram e que Varre Tudo contou às autoridades o que havia ocorrido com seu primo, puderam retomar a reunião.
– Bom, senhores. Estamos aqui reunidos com vocês para entrar em um acordo com os funcionários da COVAT e encerrar essa greve, pelo bem da nossa cidade. – disse o prefeito.
– Ih...já ouvi essa história antes... – cochichou Abelhão no ouvido de Varre Tudo, descrente de que a reunião lhes traria benefícios.
– Estamos dispostos a atender a todas as suas exigências, entretanto, uma delas poderá apenas ser parcialmente atendida. – explicou o prefeito.
– E qual das nossas reivindicações será parcialmente atendida, senhor prefeito? – perguntou Varre Tudo.
– É a questão que envolve o aumento dos salários. – respondeu o prefeito. – Não será possível conceder um aumento de 15%. O máximo que podemos oferecer é um reajuste de 9,5% no valor real dos salários de todos os funcionários da COVAT.
Varre Tudo e Abelhão entreolharam-se por alguns segundos. Varre Tudo pensou que a proposta era justa, visto que todas as exigências seriam acatadas, o que garantiria aos trabalhadores melhores condições de trabalho. O aumento do salário, apesar de não atingir o percentual desejado, já faria a diferença na renda das famílias que tiravam o sustento do lixo. A decisão estava tomada. Abelhão acenou para Varre Tudo positivamente com a cabeça, autorizando o amigo a aceitar a proposta.
– Tudo bem! Aceitamos os 9,5% de aumento nos salários se tivermos a garantia de que as demais reivindicações serão atendidas prontamente. – declarou Varre Tudo às autoridades.
– Ótimo, senhores! Eu, como prefeito, lhes dou a palavra. As exigências serão atendidas imediatamente. – afirmou o prefeito, satisfeito com o desfecho da reunião.
– E também há outra coisa que precisa acontecer imediatamente. – disse Seu Pedroca aos funcionários. ­– Precisamos voltar ao trabalho agora mesmo! A cidade precisa do empenho de todos os funcionários da COVAT. Temos que reunir esforços para deixar Nova Rita Santa limpa e organizada novamente!
– Com certeza, Seu Pedroca! Pode contar com nós! Vamos fazer tudo o que for preciso pra colocar a cidade em ordem! – empolgou-se Varre Tudo.
– E quantos dias vocês acham que serão necessários para varrer todas as ruas, recolher todo o lixo e deixar a cidade limpa? – indagou o presidente, Manuel Vargas.
– Bom, precisamos estabelecer uma meta! – afirmou Varre Tudo. Se organizarmos um mutirão pela limpeza da cidade, mobilizando todos os funcionários da COVAT, sejam eles varredores, coletores ou capinadores, acredito que em cinco dias de trabalho seremos capazes de deixar Nova Rita Santa brilhando!
– Muito bem! Em cinco dias Nova Rita Santa voltará a ser a cidade exemplo do Estado em questão de limpeza, coleta de resíduos e preservação ambiental! Está na hora de retomar o serviço! Mãos à obra, pessoal! – exclamou Seu Pedroca.
Varre Tudo e Abelhão saíram da sala de reuniões. Estavam satisfeitos com o resultado. Agora se sentiam mais valorizados e respeitados não só pela empresa para a qual trabalhavam, mas também por toda a população de Nova Rita Santa. A importância de seu trabalho havia sido reconhecida. Estavam muito mais motivados para exercer suas funções e, principalmente, para retomar suas atividades depois dos benefícios conquistados com a greve. Ao chegarem ao lado de fora da prefeitura, os dois varredores comunicaram aos demais trabalhadores da COVAT que lá estavam reunidos o resultado positivo da reunião. Todos se abraçaram e comemoraram a conquista. Em meio à algazarra, Varre Tudo, como líder dos grevistas, pediu que todos prestassem atenção ao que tinha para dizer.
– Pessoal! Temos uma missão muito importante neste momento. Nossas exigências foram atendidas, mas diante da situação da cidade não temos tempo para ficar aqui comemorando. Vamos celebrar nossa vitória ajudando na limpeza de Nova Rita Santa. Temos cinco dias para deixar tudo impecável! Por isso, precisamos retomar o trabalho imediatamente! – determinou Varre Tudo, cuja fala foi seguida de aplausos calorosos.
A partir do anúncio de Varre Tudo, todos os trabalhadores dirigiram-se à sede da COVAT com o intuito de se prepararem para o mutirão de limpeza que movimentaria a cidade nos próximos cinco dias. Os coletores embarcaram nos caminhões da coleta de lixo orgânico e seletivo e os varredores apanharam seus carrinhos, vassouras e pazinhas. Os capinadores, ao invés de exercer sua função rotineira, foram servir de reforço na varrição das ruas centrais, visto que a sujeira nesses locais era muita para que os apenas 123 varredores conseguissem dar conta de todo o trabalho. Além disso, a população foi incentivada a colaborar com o mutirão de limpeza. Quem se disponibilizasse, poderia varrer a calçada em frente à própria residência. Se cada um fizesse a sua parte, a meta de reorganizar a cidade em cinco dias seria facilmente cumprida. Era preciso, então, a colaboração e participação de todos os habitantes. Só assim Nova Rita Santa voltaria a ser uma cidade bela e agradável para se viver.

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Episódio 34


A população estava perplexa com os acontecimentos da última semana. Nunca Nova Rita Santa andara tão agitada, com greves, tráfico, atentados. A população estava assustada. Enquanto Shirley e Varre Tudo conversavam, tocou o celular dela: era Seu Pedroca, avisando que na manhã seguinte haveria uma reunião às 7h30min na Prefeitura. Os colegas comemoraram a ligação, e ficaram imaginando qual seria a nova proposta para que a greve chegasse ao final.
É sexta-feira, 7h, e Abelhão é liberado pela polícia. Corre para a Prefeitura e quando encontra os colegas fica sabendo da reunião. Varre Tudo indaga sobre a prisão, sobre o bem-estar do colega, mas ele não lhe dá ouvidos: está concentrado com a reunião das 7h30min e quer estar preparado para ouvir as propostas da COVAT.
- Vamos lá. Dessa vez vamos conversar como iguais. Não vou baixar minha cabeça para o prefeito e os outros, somos trabalhadores e devemos lutar por nossos direitos. - diz Abelhão, com os olhos brilhando. - Nossa luta não é somente entre COVAT e funcionários, mas também entre todos os trabalhadores e seus empregadores. - concluiu.
Varre Tudo achou estranho seu primo Jéferson não ter aparecido naquela manhã. Jaciara e os outros até comentaram dia desses o empenho e envolvimento de Jéferson com uma causa que nem lhe diz respeito, e Varre Tudo ficou emocionado com a demonstração de amizade do primo.
A reunião começou e Manuel Vargas mostrava-se abatido. Estava cansado após uma semana de cabo-de-guerra com os trabalhadores. Ficou quieto por um longo tempo, enquanto o resto discutia as propostas de ambos os lados.
Enquanto isso, Juseppe dirige freneticamente. Parece um maluco, com Maurício ao seu lado, também com os olhos vidrados na estrada. No banco de trás está Jéferson, amarrado e amordaçado, em meio a galões de gasolina. Foram os 15 minutos mais demorados da vida de Jéferson, que fora arrancado da cama naquela manhã, sem saber porque. Agora, estava ali, prevendo seu fim, e lembrando do dia em que tentara “enganar” Maurício e Cabelera na gráfica. Fechou os olhos com a esperança de que o pesadelo acabasse logo.
O carro parou e Jéferson foi arrancado de dentro do veículo e jogado no chão, em meio a galinhas, porcos e muita sujeira. Não conhecia aquele lugar, mas percebeu que se tratava de uma chácara. Os olhos encheram-se de terra, a boca seca, o corpo dolorido das amarras. Mal conseguia raciocinar quando levou um chute na barriga, que atingiu o rim. A dor era insuportável. Depois de alguns chutes e baldes d'água, ameaças e agressões, Maurício e Juseppe começaram o interrogatório.
- Tu é muito burro né, meu! Tu achou que a gente não ia descobrir que era tu? Quem mandou tu abrir a matraca, hein? - disse Maurício.
- É cara! Tu pensa o quê? Que mexer com a gente é brincadeira de criança? Agora tu vai sofrer as consequências. E pode abrir a boquinha porque quero saber pra quem tu trabalha. - remendou Juseppe, dando mais um chute em Jéferson.
O jovem cuspia sangue e estava semi-consciente. Não queria falar nada, nem entregar seu primo Varre Tudo, mas quando entrou naquela fria jamais imaginara que a história iria tão longe. Jéferson era estudioso, interessado, não queria morrer ali. Tinha um futuro e sabia que Juseppe e Maurício não estavam nem um pouco interessados nisso. Pensou mais um pouco, entre chutes e tapas, e decidiu contar tudo.
- Eu, eu... - disse Jéferson, com a voz rouca, quase sem forças. - Sou primo do Varre Tudo, eu ajudei ele porque a gente tava desconfiado de vocês. Mas pelo visto a gente tava certo, vocês são uns bandidos mesmo. - disse, e arrependeu-se logo em seguida de suas palavras ao levar mais um chute. Dessa vez, desmaiou de tanta dor.
Juseppe e Maurício entreolharam-se. Sabiam o que fazer. Jogaram Jéferson no banco de trás do carro e dirigiram até o centro da cidade. Atiraram o jovem dentro de um contêiner imundo e espalharam gasolina por todo o lado. Riscaram o fósforo e, “delicadamente”, atiraram o palito sem olhar para trás. Ao longe, avistaram a fumaça e riram.
- Assunto encerrado. - sentenciou Juseppe.
Os conteineres e a sujeira ardiam em brasa. Animais que dormiam junto às lixeiras também logo sentiram as chamas. O fogo se alastrava rapidamente, e os contêineres ardiam ao calor das chamas. O cheiro e a fumaça eram insuportáveis, e a população começou a perceber o incêndio. Em meio à confusão, um jovem acorda, de sobressalto. Era Jéferson, que, por milagre, voltou a si após meia hora desmaiado. Quando se deu conta de onde estava e do que estava acontecendo, reuniu as forças que lhe restavam e se atirou para fora do contêiner, com diversas queimaduras pelo corpo e sem acreditar que conseguira sobreviver.
Ao sair, pessoas o fitavam assustadas. Quando foram lhe prestar ajuda, Jéferson disse:
- Me levem até a prefeitura.
Entrou ao trancos e barrancos, ferido, esfarrapado, na reunião da COVAT. Varre Tudo deu um pulo quando viu o primo e correu ao seu encontro. Jéferson contou rapidamente o acontecido, enquanto o prefeito avisava à polícia e ao Corpo de Bombeiros. Seu Pedroca chamou uma ambulância que levou Jéferson para o hospital. Varre Tudo quis ir com o primo, mas ele negou a companhia. Disse ao primo o que ele deveria fazer, agradeceu a preocupação e se foi, acompanhado da equipe da ambulância.
Varre Tudo parou por um minuto. Prendeu o choro. Recuperou-se do baque, entrou num carro da polícia e rumaram à chacara de Catarina. Ao chegarem ao local, encontraram Maurício, Juseppe, Cabelera, Capitão do Mato e o próprio Catarina. Eles tentaram fugir, mas foram capturados pela polícia. Quando Varre Tudo chegou, os cinco estavam algemados, sentados num canto, enquanto respondiam aos questionamentos dos policiais. Surpreendeu-se ao ver Capitão do Mato ali, mas o susto maior foi quando avistou Catarina.
- Meu Deus, é ele. É ele o cara que me assaltou! É ele, meu Deus! - surpreendeu-se Varre Tudo, ao constatar que ele era, também, o homem que tentava assustá-lo na Árvore do Enforcado no Parque do Sabiás. Varre Tudo estava perdido, desolado com tantas surpresas numa única manhã. Sentiu as pernas tremerem e se deixou cair na cadeira.

terça-feira, 23 de outubro de 2007

Episódio 33


A quinta-feira amanheceu ensolarada. As pessoas que passavam na rua Presidente Castelo Branco, no Centro, paravam espantadas. Cabelera e Maurício chegaram à gráfica de carro e se espantaram com a multidão. Desceram da camionete com cuidado. Eles tinham acabado de vir da chácara do Catarina com um novo carregamento de aves raras. Atravessaram a rua e não conseguiam acreditar no que viam. As gaiolas estavam abertas e espalhadas por toda a rua. A população comentava revoltada a situação das aves.
- Que horror! Em pleno centro da cidade, um lugar desses! Maltratando os bichinhos. Gente sem consciência! E depois reclamam dos garis da COVAT, é por causa de pessoas como essas aí que o mundo está perdido! – reclamava uma senhora.
- Calma, vó! Não é pra tanto também! – disse a jovem.
- Menina! Você já tem 15 anos e ainda não aprendeu! Não é para tanto? Você por acaso sabe que tem pessoas que tiram o sustento da família do lixo? Tem olhado as ruas da cidade? Consegue respirar? Claro que não! Mas tem pessoas que limpam Nova Santa Rita pra ti! E pessoas que sentem esse cheiro todos os dias! – falava severamente para a neta.
- Ai, vó, desculpa! Nunca pensei assim. A senhora tem razão. Vou ligar pra polícia.
Cabelera e Maurício suavam frio, eles atravessaram a rua e fugiram sem serem percebidos em meio a multidão. No caminho decidiram devolver os animais para o Catarina, mas não iriam contar o que tinha acontecido.
- Cabelera! Eu te falei que o cara da responsa ia aprontar, meu!
- Pô, mano! Como eu ia saber! Tinha pinta de malandro! Mas tem volta! – frisou indignado.
Eles seguiam para a chácara e passaram por duas viaturas da Polícia Federal do Meio Ambiente, que tinha uma pequena sede na cidade, justamente porque a cidade era modelo em todo o estado na questão ambiental. Os dois seguiram em frente e suspiraram aliviados enquanto os policiais iam em direção à gráfica. A multidão estava impaciente. Já tinham ligado para a redação do Picadeiro. A repórter chegou e começou a entrevistar as pessoas que estavam na rua. Os policiais entraram na gráfica, acompanhados por Eduarda, repórter do Picadeiro e o fotógrafo Paulo. Enquanto os agentes procuravam provas que os auxiliassem no processo, Eduarda acompanhava atentamente. A situação era deplorável, muitas aves estavam mortas e outras bem machucadas. A moça aguardou os polícias terminarem para poder conversar com um deles. Abordou o mais simpático.
- Então? Tu pode conversar comigo sobre a ação? – perguntou Eduarda.
- É cedo ainda para qualquer conclusão, mas está claro que traficavam aves raras nesse local. Encontramos 20 animais mortos e mais de 30 aves machucadas. E muitas devem ter fugido, pela quantidade de gaiolas lá fora, acredito que tinha mais de 600 aves mantidas em cativeiro aqui. Vamos nos mobilizar e prender os envolvidos. – afirmou o agente Ângelo Almeida.
Depois de conseguir as informações necessárias Eduarda e Paulo retornaram para o jornal. No caminho ela falava toda empolgada das idéias para a manchete do Picadeiro. Juseppe, que morava no bairro dos Jardins, do outro lado da cidade, tinha tirado duas semanas de férias. Ele pretendia ir até a gráfica avaliar o novo carregamento, assinar alguns papéis e pegar dinheiro. Tinha combinado de levar Jaciara até a capital para passarem mais tempo juntos e conversarem. Em Nova Rita Santa não havia condições de passear pelas ruas. O cheiro era insuportável. Fazia uma semana que os funcionários estavam em greve e a população se sentia como se morasse em um lixão. Já eram quase quatro e meia e ele ia buscar Jaci às seis. Saiu e decidiu passar na banca do seu Joaquim e comprar umas revistas. Encontrou um dos vizinhos no caminho.
- E aí Juseppe, me diz uma coisa. Como está aquele guri que perdeu a mão? – perguntou.
- Não sei e nem tenho interesse. Onde já se viu? A cidade imunda, com insetos por todos os lados, tudo por culpa desses garis sem consciência.
- Nossa, Jussepe! Eles têm razão em lutar por melhores condições. Olha só, logo você, que é um colega deles falando assim!
- Não sou colega de lixeiros! – disse.
- Ah! Deixa pra lá. Só sei que apóio eles, e sem os “lixeiros” a cidade vai ficar cada vez pior.
- Tá bom! – exclamou irritado.
Ele foi até a banca e ficou curioso. Várias pessoas estavam comprando o jornal e comentando. Juseppe pegou o jornal e suou frio ao ler:
EXTRA – EDIÇÃO ESPECIAL
Aves raras são encontradas em gráfica clandestina no centro da cidade
A cidade amanheceu diferente na manhã desta quinta-feira, em meio ao lixo acumulado há uma semana, os moradores da rua Presidente Castelo Branco, no Centro, foram surpreendidos ao sair de casa. Em frente à Gráfica Papagaio, uma das mais tradicionais do município, havia mais de 600 gaiolas, que eram usadas para manter aves raras em cativeiro. A Polícia Federal do Meio Ambiente encontrou 20 aves mortas e mais de 30 com diversos ferimentos. Algumas ainda estavam na calçada, sem força para tentar voar e ganhar a liberdade. Além disso, apreenderam pilhas de documentos, papéis falsificados, livros e revistas sobre aves raras e espécies em extinção. Dentro de uma gaveta com fundo falso acharam um bloco de notas frias e um catálogo com os valores cobrados por animal e uma agenda com nomes, telefones e endereços. Os agentes interditaram o local e iniciaram as investigações.

Juseppe sentiu o chão se abrir sob seus pés. Tudo ficou escuro enquanto ele caia para trás, segurando a edição extra do Picadeiro apertada contra o peito.

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Episódio 32



Ainda com aquelas roupas, os funcionários da COVAT decidiram conversar com Varre Tudo para saber o plano dele para dar fim à gráfica clandestina de Juseppe. Encontraram um restaurante perto do Parque dos Sabiás e, enquanto almoçavam, Varre Tudo contou o plano.
- Seguinte, galera! Agora que todos já sabem o que o Juseppe faz nas horas vagas, administrando aquela gráfica clandestina, decidi tomar uma atitude radical. Pensei em “assaltar” a gráfica e libertar todos os pássaros que são maltratados e mortos naquele lugar.
- Nossa Varre! Que aventura!! – disse Shirley.
- Ah! Gente. – continuou Varre Tudo. – só não quero que a Jaciara saiba disso agora, prefiro contar para ela depois...
- Certo Varre! Agora conta o teu plano. – disse Abelhão
- Bem, vamos chegar à noite ....
Enquanto Varre Tudo contava a história, outros manifestantes, que tinham saído da praça para almoçar, começaram a correr na frente do restaurante. A agitação chamou a atenção de Josias, que estava olhando pela janela. Ele chamou os amigos e todos saíram em disparada do restaurante.
Quando chegaram na praça, os manifestantes já estavam dispostos como um paredão e, na frente dele, estava o pelotão de Choque da Polícia Militar de Carlo Campo, cidade que fica a 35 Km de Nova Rita Santa.
- Meu Deus! Os homens vieram, temos que chamar o coronel Castilhos, ele prometeu que um confronto entre manifestantes e polícia não iria acontecer. E agora isso! – gritou Abelhão.
Enquanto isso, o pelotão avançava contra os manifestantes. Varre Tudo e Shirley se arrepiaram quando os policiais começaram a bater com o cassetete no escudo de ferro. O som era aterrorizador e eles ficaram com medo do que poderia acontecer. Enquanto isso, Coronel Castilhos gritava no megafone:
- Manifestante! Parem com essa greve imediatamente! Não queremos machucar ninguém, mas se não houver acordo, teremos que usar a força e a repressão!
Abelhão chegou no Coronel para tentar negociar alguma coisa com ele.
- Coronel, não posso dispensar os manifestantes. Eles ainda estão indignados com o que aconteceu com nosso amigo Junior, funcionário da COVAT e ...
- Não quero saber. A ordem é dispensar os manifestantes, a governadora já disse: se não tiver acordo agora, vamos prender os agitadores e dispensar os outros à bala. – disse Castilhos interrompendo Abelhão.
- Mas, coronel, o senhor tinha me prometido ...
- Eu não prometi nada!
- Tudo bem! – disse Abelhão por fim - desse jeito, teremos que enfrentar a polícia e, se alguém morrer aqui, teremos um guerra!
Abelhão virou as costas para o coronel, mas não conseguiu escapar do capitão Oscar que o pegou pelos braços.
- Você está preso pela agitação toda que vem fazendo nos últimos dias e por desrespeitar o coronel Castilhos.
Ao ver que Abelhão foi jogado dentro do camburão e, o fato de ele ser negro, atiçou ainda mais a indignação de todos os manifestantes. Eles começaram a gritar frases de José Luthzenberger e a situação estava ficando cada vez mais delicada. A comissão de greve, formada por Varre Tudo e agora Josias, resolveu marcar uma outra reunião com a direção da COVAT. Mas, antes disso, tinham que negociar com a brigada.
- Coronel Castilhos, gostaríamos de informar ao senhor que aqui todos são trabalhadores e que não queremos que ninguém se machuque. O senhor agora prendeu o Abelhão e, dessa forma, enxergamos que a Brigada não agiu de maneira correta. Vamos ficar aqui, todos os manifestantes e prometemos marcar uma reunião com a direção da COVAT para que possamos terminar a greve. Então, gostaria de pedir ao “senhor” que mandasse os homens embora. – Varre Tudo falou aquelas frases com medo, mas, pensou em Abelhão e nos outros manifestantes, que poderiam sair machucados daquela situação.
- Certo rapaz, mas faço isso, pois recebi ordens de não entrar em confronto.
Os policiais começaram a ser dispensados e Varre Tudo ficou feliz, mas, Abelhão iria passar a noite na delegacia, pois o coronel Castilhos não estava disposto a libertá-lo.
À noite, depois de toda a agitação do dia, Varre Tudo se encontrou com Shirley, Josias, o primo Jéferson e Magali. Eles iriam colocar o plano de libertar os pássaros em prática. Varre Tudo trouxe as toucas de “ninja” e roupas pretas, para que ninguém os reconhecesse se o plano falhasse. Jéferson foi o encarregado de arrombar a porta dos fundos, pois já conhecia o lugar, Shirley e Magali ficaram do lado de fora, para avisar se alguém estivesse chegando, e Josias e Varre Tudo iriam soltar os bichos. Uma agitação tomou conta deles quando Jéferson conseguiu arrombar a porta. Eles entraram e o que viram foi assustador. Alguns animais já estavam mortos. Varre Tudo disse aos amigos que soltaria os animais na rua mesmo. Depois da ação, Jéferson fechou a porta e eles saíram discretamente pela rua escura.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Episódio 31



Varre Tudo e Abelhão eram os mais decepcionados. Na saída da reunião, nenhum dos dois falava. Os funcionários esperavam alguma ação. Shirley queria consolar os amigos, mas também não sabia o que fazer. Foi Josias quem disse:
- Vamos até o escritório. Nós temos que fazer estes caras perceberem que, ou eles negociam, ou a cidade vai ficar infestada de lixo. Eu sinto muito em ver minha cidade assim! Mas a gente não pode voltar atrás sem uma solução.
- Tem razão! - reanimou-se Abelhão – Lá, a gente planeja algo para amanhã!
Varre Tudo continuava calado. Os funcionários decidiram que iriam caminhando até a COVAT. O grande grupo chamava a atenção da população, mesmo sem cartazes e sem fazer qualquer manifestação sonora. Alguns moradores observavam indignados, mas o silêncio daqueles trabalhadores parecia barrar qualquer um que quisesse reclamar ou até apoiar. Era uma marcha silenciosa, que deixava a população boquiaberta.
Quando chegaram na sala de reuniões, os funcionários acomodaram-se como puderam, já que o local era pequeno. Varre Tudo e Abelhão ficaram de pé diante dos colegas. Varre Tudo soltou os ombros num suspiro.
- Eu tive uma idéia. Uma vez, na escola, nós fizemos um teatro sobre os insetos. Tem fantasias de mosca e outras de barata. Eu tenho algumas delas na minha casa. Posso conseguir mais! - dizia Varre Tudo empolgado - Amanhã, vamos voltar aqui vestindo essas roupas. Se o Vargas não concordar com nossas reivindicações, vamos para a praça e vamos deixar a população ciente da importância do nosso trabalho!
- Boa idéia! - gritou Abelhão.
Eles decidiram como cada um iria vestido. Algumas mulheres, que sabiam costurar, produziriam fantasias de ratos e bactérias. A reunião terminou quando o encontro ficou marcado para a quarta-feira, às 6 horas da manhã, na COVAT. Eles decidiram que iriam cedo, ficariam lá durante uma hora e, se, nada fosse resolvido, iriam para o centro da cidade e pegariam a movimentação de quem estivesse saindo para o trabalho.
Ratos, baratas, moscas, pragas, bactérias... Os bichos mais terríveis fantasiavam mais da metade dos protestantes, quando chegaram à empresa, na manhã do dia seguinte. Seu Pedroca viu a cena de sua janela e logo foi para fora.
- Chame o Vargas! Nós queremos falar com ele! - ordenou Varre Tudo.
- Mas... Mas... - Seu Pedroca baixou a cabeça – Vargas foi para a capital hoje...
- Então vamos para a praça – gritou Abelhão erguendo o braço direito e voltando-se para os colegas.
Todos gritavam ao mesmo tempo:
- Se não houver uma solução!
A cidade vai virar lixão!
Assim que a COVAT acordar,
A cidade nós vamos limpar!
Seu Pedroca não sabia se impedia o grupo, ou não. Mas ele estava sozinho e ninguém ia ajudá-lo. O grupo seguia.
No centro da Praça Pio X, Varre Tudo subiu em um banco. Abelhão acompanhou o amigo. Varre Tudo era uma barata e Abelhão um rato gordo. As pessoas que passavam pela praça achavam graça nas fantasias e se aproximavam pensando que algum evento infantil estava acontecendo. A maioria ouvia o que os varredores diziam e ficava por aí. Outras poucas pessoas ignoravam.
- Nós precisamos do apoio da comunidade! Nós não queremos que a cidade fique cheia de insetos e muito menos de lixo! Queremos que vocês compreendam que a cidade produz uma quantidade enorme de lixo e que o nosso trabalho é muito importante para que ele tenha a destinação correta! - explicava Varre Tudo - Nós estamos cansados! Queremos o apoio de vocês! Quem puder se manifestar de alguma forma, sempre ajuda! Entrem em contato com a COVAT e reivindiquem! Assim que eles atenderem nosso pedido, prometemos que esta cidade vai voltar a ficar limpa e ser o exemplo que sempre foi.
Um homem que passava, ouviu o protesto, mas não concordou com o que estava sendo dito e se manifestou.
- Vocês é que são os responsáveis por essa bagunça que a cidade está se tornando!? Não têm vergonha? Isso é politicagem! Vocês querem mesmo é aparecer! Deixem de fazer farra na praça central e vão recolher o lixo! - disse o homem jogando uma embalagem de sorvete no chão – Olha só! Vocês merecem mesmo um aumento! Mais trabalho para os garis! Mais trabalho para os garis! – gritava satirizando.
Abelhão não suportou, ficou muito nervoso.
- Tomara que o senhor fique bem doente! Mais trabalho para os médicos! Mais trabalho para os médicos! - retrucava Abelhão.
Varre Tudo tentava acalmar o amigo. O homem estava indo embora e Abelhão gritava a frase de José Luthzenberger:
- Na hora, digo o que penso, boto para fora. Uso a emoção. Se alguma coisa me excita, falo excitado. Se me agridem, passo a agredir – acalmou-se e finalizou - Mas não sinto raiva ou ressentimento.
Varre Tudo está empolgado. Ele pára um pouco e lembra de tudo o que passou nos últimos dias. Ele lembra das falcatruas de Juseppe e não compreende como Jaciara, uma menina tão sincera e cheia de boas intenções, pode ser tão próxima de um cara mau caráter como ele. Outro dito que sua mãe repetia lhe vem a memória: “A vida é muito curta para ser pequena”. Assim, ele decide que a partir desse dia consertaria tudo que estivesse errado. E ia começar pela gráfica clandestina de Juseppe.
Um clima constrangedor pairou na praça depois da discussão. Eles decidiram encerrar o protesto. Antes de ir embora, Varre Tudo revelou para os colegas o que acontecia nos fundos da Gráfica Papagaio. Contou a todos que tinha um plano e que precisava da ajuda deles. Os funcionários aceitaram.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Episódio 30


No dia seguinte, a situação da sujeira na cidade era ainda mais desesperadora. As ruas centrais exalavam um cheiro insuportável devido aos sacos de lixo que transbordavam dos contêineres e eram empilhados em todas as esquinas. As pessoas que circulavam pela área central chegavam a tapar o nariz com as mãos quando passavam em frente de um dos contêineres rodeados de moscas e cachorros vira-lata em busca de comida. Os funcionários da COVAT lamentavam a situação, pois aquela também era a cidade deles e, obviamente, gostariam de vê-la limpa, organizada e bela, como sempre havia sido. No entanto, sabiam que estavam lutando por uma causa justa e importante para todos e, por isso, não podiam desistir na metade do caminho. Determinados a conquistar melhores condições de trabalho e melhor remuneração, fariam tudo o que fosse necessário, nem que para isso a cidade se transformasse em um verdadeiro "lixão".
O presidente Manuel Vargas e o prefeito Mostarda Moura, que já haviam se encontrado dias antes para discutir sobre a greve dos trabalhadores da COVAT, começavam a se preocupar com a situação de Nova Rita Santa. Algo precisava ser feito com urgência. Eles não poderiam deixar que o município, reconhecido como um dos mais modernos e bem organizados do Estado em questão de limpeza, coleta e reciclagem de lixo, virasse notícia em função da sujeira e do descaso com o acúmulo de resíduos. Além disso, a saúde pública também começava a ser ameaçada pela sujeira, visto que o grande número de ratos e baratas atraídos pelo lixo poderia contribuir para a disseminação de doenças, principalmente nos bairros mais desfavorecidos.
Assim, movidos por essas e outras preocupações, Manuel Vargas e Seu Mostarda resolveram convocar os líderes da greve para a reunião no escritório administrativo da COVAT. O objetivo era tentar entrar em um acordo com os funcionários para que os mesmos voltassem ao trabalho e, conseqüentemente, fosse possível normalizar a situação da limpeza e da coleta de lixo na cidade. O presidente Manuel Vargas, porém, continuava irredutível quanto à exigência de aumento de 15% nos salários e ao pedido de que não fossem descontados do pagamento dos varredores os dias de chuva, nos quais não podem trabalhar. As demais reivindicações até poderiam ser atendidas, mas as negociações seriam acirradas. De qualquer maneira, decidiram contatar os representantes dos trabalhadores e agendar uma reunião para a primeira hora da tarde.
Quando souberam da decisão, Varre Tudo e seus amigos comemoraram. O encontro com o presidente da COVAT e com o prefeito da cidade representava a chance de os trabalhadores terem suas exigências atendidas. Todos estavam ansiosos para a reunião e aproveitaram os últimos minutos para repassar as sete reivindicações que haviam anotado na semana anterior.
– Pessoal, precisamos estar cientes de todas as nossas exigências. Vamos nos unir e lutar por elas. Não podemos abrir mão do que decidimos! – disse Varre Tudo, que buscava motivar os colegas.
– É isso aí! – gritou Abelhão. – Não podemos ceder aos pedidos nem às ameaças do presidente Manuel Vargas. Vamos exigir nossos direitos e conquistar melhores condições de trabalho pelo nosso amigo Junior, que está sofrendo no hospital neste momento!
– Falou e disse, Abelhão! Além de pensar no nosso bem-estar, devemos isso ao Junior. Ele merece o nosso empenho e esforço! – completou Magali, enquanto olhava fixamente para Varre Tudo.
O relógio não marcava nem uma hora da tarde quando os coletores, capinadores e varredores concentraram-se em frente à sede administrativa da COVAT. Carregando cartazes e gritando frases de protesto, os trabalhadores formaram uma multidão para receber o prefeito e o presidente, que, em seguida, chegariam de carro ao local. Enquanto isso, Varre Tudo e Abelhão, líderes dos varredores na greve, mais as duplas de representantes dos capinadores e dos coletores já se acomodavam nas cadeiras estofadas do escritório da COVAT para aguardar o início da reunião. Varre Tudo sentia o coração bater mais forte e as mãos suarem. O encontro estava prestes a se iniciar e eles precisavam sair vitoriosos. Ao seu lado, Abelhão, mesmo sem muito experiência com negociações, demonstrava confiança. Poucos minutos depois, a porta do escritório se abriu.
– Boa tarde, senhores! – cumprimentou-os o prefeito Mostarda Moura.
– Boa tarde! – responderam os trabalhadores.
– Primeiramente, gostaria de deixar claro que eu e o presidente Manuel Vargas estamos aqui a fim de entrar em acordo com os senhores. Faremos o possível para atender às suas exigências e para reverter a situação em que nossa cidade se encontra. – explicou Seu Mostarda.
– Ótimo. – disse Varre Tudo. – Estamos dispostos a voltar ao trabalho assim que todas as nossas reivindicações forem aceitas.
– Algumas de suas reivindicações são inaceitáveis! – exclamou Manuel Vargas, interrompendo o prefeito, que estava prestes a se pronunciar. – O máximo que podemos garantir é o auxílio creche para as funcionárias, o auxílio alimentação de 5% ao mês e o pagamento de horas extras. As demais exigências são absurdas! Simplesmente impossíveis de serem acatadas no momento.
Os trabalhadores entreolharam-se por um instante, incrédulos do que estava acontecendo. Todos imaginavam que a reunião significaria que Manuel Vargas, juntamente com o prefeito, aceitaria as reivindicações dos trabalhadores e negociaria com eles o retorno ao trabalho. Estavam enganados. Varre Tudo decidiu manifestar seu descontentamento com o encontro:
– Senhor prefeito e senhor presidente, os senhores nos convocaram para vir até aqui apenas para anunciar que não atenderão nossas exigências? – indagou o varredor. – Digo isso porque, se é assim, estamos apenas perdendo tempo nesta sala. Não vamos desistir de nossos objetivos. A greve vai continuar se não chegarmos a um acordo digno.
– Pois eu já lhe ofereci um acordo digno, caro varredor. – disse Manuel Vargas, ironicamente. – O senhor é que não valorizou a oportunidade. Já disse que algumas das exigências são absurdas. Portanto, atenderemos somente as que forem viáveis para a empresa e para a cidade.
– E quanto ao aumento de 15% nos salários? – perguntou Abelhão.
– Essa é uma das exigências impossíveis. O máximo que poderíamos negociar seria um aumento de 5% nos salários. – respondeu o presidente.
– Sinceramente, pessoal! O presidente e o prefeito estão fazendo piada com a nossa cara. Vamos embora! Não temos mais nada para discutir aqui! Temos uma greve para dar continuidade! – disse Abelhão, enquanto levantava-se da cadeira.
Todos começaram a se exaltar. Os trabalhadores, indignados, conversavam entre si, enquanto Varre Tudo tentava conversar com Seu Mostarda e o presidente. A reunião, que havia sido iniciada de maneira civilizada, agora estava fora de controle. Assim que ficaram sabendo do resultado negativo do encontro, os funcionários que se concentravam em frente à sede da COVAT dirigiram-se para o prédio da Prefeitura. No caminho, começavam a bolar um protesto surpresa para o dia seguinte, algo que realmente fosse capaz de abrir os olhos de todas as autoridades, e também da população, para as conseqüências da greve dos varredores e coletores da cidade.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Episódio 29


O final de semana passou batido, mas não para os moradores de Nova Rita Santa. A sujeira acumulava mais a cada dia, e o mau-cheiro incomodava as pessoas. A cada turno que a COVAT deixava de trabalhar, maior era o desespero das pessoas em relação ao que fazer com o lixo que acumulava em suas casa. As lixeiras particulares estavam abarrotadas, os contêineres não tinham espaço para mais nada, e os cachorros de rua rasgavam as sacolas fedorentas em busca de alimento. A cidade, reconhecida pelo asseio e organização, agora virara um caos.
Era segunda-feira e a esperança de que a greve acabaria logo habitava o coração e o pensamento dos moradores da cidade. Eles estavam divididos entre entender ou não os motivos da greve. Muitos achavam que os funcionários da COVAT estavam desrespeitando a população, que nada tinha a ver com aquela questão, e estava sendo diretamente prejudicada. Um desses era Juseppe, que fazia questão de gritar aos quatro ventos que os funcionários da COVAT eram interesseiros e só pensavam em dinheiro. Outros entendiam a manifestação dos trabalhadores por melhores salários, mas principalmente por melhores condições de trabalho, e comentavam o acidente de Junior, entre eles, Jaciara. De um lado, a intransigência de Juseppe e sua intriga pessoal com Varre Tudo. De outro, o amor de Jaciara.
- Acho melhor não tocarmos no assunto da greve enquanto as coisas não estiverem acertadas. – disse Jaciara, olhando fixamente para o namorado.
- Concordo, cada um com sua opinião. – sussurrou Juseppe, com a voz apreensiva.
Enquanto as pessoas tentavam levar sua vida normalmente, o lixo se acumulava mais e mais. A discussão estava presente nas escolas, nos bares, em todos os lugares, e pela primeira vez na vida, algumas pessoas começaram a perceber a importância dos “lixeiros”, como eram conhecidos, para a manutenção da saúde e do bem-estar de uma população.
Uma dessas pessoas era dona Rosinha, que adorava delatar os funcionários da COVAT para Seu Pedroca, mas que desta vez estava era com saudades daquelas figuras tão discretas e onipresentes, e ao mesmo tempo tão necessárias.
Nem o céu parecia satisfeito com aquela situação. As nuvens eram estranhas, o azul não era límpido. A impressão era de que a cidade havia retrocedido décadas, pois as pessoas conviviam lado a lado com o lixo, sem saber o que fazer com ele. Alguns órgãos e profissionais da saúde chamaram atenção para a responsabilidade das pessoas com a finalidade de seu próprio lixo, surgiram estatísticas, gráficos, e muita explicação e reflexão sobre a quantidade de lixo produzida pelo homem.
Longe dessas reflexões estavam Varre Tudo, Magali e Abelhão. Eles, acostumados a conviver com o lixo, tinham consciência de sua própria colaboração para o acúmulo de resíduos, mas naquele momento o que interessava era a greve, e bolar um jeito de convencer as autoridades de que a aceitação das solicitações dos funcionários da COVAT era para o bem de todos.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Episódio 28




Às oito da manhã de quinta-feira Varre Tudo e os amigos estavam aguardando seu Pedroca na sala de reuniões da COVAT. Eles decidiram ainda na noite anterior formar uma comissão responsável pelas negociações. Varre Tudo e Abelhão representavam os varredores, Igor e Carlos os capinadores e Vagner e Lúcio os coletores. A reunião estava marcada para as 8h15, mas tinham chegado antes para decidirem como iriam abordar a questão relacionadas ao salário e melhores condições de trabalho.
- Pessoal, não podemos sentir medo! Se não lutarmos por nossos direitos agora, vamos estar retrocedendo! – frisava Varre.
- É isso mesmo! Não podemos baixar a cabeça! – afirmou Lúcio.
Seu Pedroca chegou acompanhado pelos três gerentes de cada departamento da COVAT e pelo Presidente Manoel Vargas. Era a primeira vez que os funcionários tinham contato com o presidente da empresa. Seu Pedroca era um homem gentil, sempre atento às questões que incomodavam o pessoal que trabalhava na rua. Conhecia a todos pelo nome, e não eram poucos, 350 pessoas trabalhavam na COVAT, 250 divididos entre a capina, a coleta e a varrição. Mas Manoel era diferente, nem sequer cumprimentava os rapazes que limpavam o pátio da empresa. Varre Tudo sentiu que as negociações não seriam fáceis.
- Bom dia!
- Bom dia, seu Pedroca! – responderam em coro.
- Bem, eu quero apresentar a vocês...
- Por favor, Pedroca! Eu dispenso apresentações, eles sabem perfeitamente quem eu sou! E vamos logo ao que interessa. O prefeito já me ligou para pedir por que os funcionários estão todos na frente da prefeitura, sentados, e com cartazes. Isso é uma vergonha! Em Nova Rita Santa isso nunca aconteceu! O que querem, afinal?
- Bem, Manoel!Viemos aqui reivindicar melhores salários e condições de trabalho. O Junior, nosso colega, perdeu a mão no compactador de lixo, porque não tinha experiência, alguém tem que tomar uma atitude! – disse o rapaz calmamente.
- Olha, guri! Eu te vi no jornal. Tu tá querendo se promover? É isso? – perguntou irritado.
- Não! Aqui está a proposta. Se não for aceita, vamos decretar greve por tempo indeterminado.
Varre Tudo entregou uma cópia a cada um deles. Seu Pedroca e os gerentes estavam preocupados. Eliseu, que cuidava da varrição e gostava muito de Varre Tudo, foi o primeiro a falar.
- Manoel, temos que analisar a proposta deles com atenção. Afinal, a COVAT, tem sido um exemplo na região graças ao desempenho dos funcionários. Então...
- Eliseu! Tu deve estar maluco! Aumento de 15%! – disse ele.
Seu Pedroca e os outros gerentes decidiram intervir.
- Por favor, aguardem lá fora enquanto decidimos! – pediu gentilmente.
Mais de uma hora depois eles voltaram à sala. Seu Pedroca disse que iam se reunir com o prefeito, mas que Manoel se negava a fazer qualquer acordo e que, caso eles não voltassem ao trabalho, corriam o risco de serem demitidos.
- Nós não vamos recuar! – afirmou Carlos.
Todos concordaram e se retiram em silêncio. Eles se dirigiram à prefeitura. Quando chegaram lá, Varre Tudo contou a todos o resultado da reunião.
- Atenção pessoal! Nossa proposta não foi aceita, nem sequer tentaram negociar. O Seu Pedroca é gente boa, mas ele segue ordens do Manoel e com o presidente não tem conversa. Eles estão no gabinete do prefeito agora. Mas enquanto não decidirem aceitar nossas reivindicações ou pelo menos negociar conosco, não vamos trabalhar.
- É isso mesmo! – gritou Magali, orgulhosa do espírito de liderança de Varre.
- Vamos lutar pelos nossos direitos! – gritavam todos.
- A greve começou! – decretou Varre.
Todos aplaudiram Varre Tudo de pé. Então cantando gritos de ordem, os funcionários uniformizados, caminharam em direção ao centro da cidade. A greve estava decretada por tempo indeterminado. E com a adesão total dos varredores, capinadores e coletores de Nova Rita Santa.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Episódio 27

Dona Arzelina puxou a conversa que só foi terminar no Parque dos Sabiás, quando a chuva aumentou e os amigos não poderiam mais trabalhar. Por idéia de Shirley, eles foram até o Bar do Boca, conversar sobre o que havia acontecido com Júnior.

- Sabe pessoal, agora me lembro que em 1984 meu tio trabalhava na COVAT e um cara se machucou quase da mesma forma que o Júnior. Mas, naquela época a coisa era pior, os trabalhadores da empresa nem tinham insalubridade e não eram assistidos quando ocorriam acidentes como esse. – relembrou Abelhão.

- Nossa! Em lembrar que uma vez era bem pior. – comentou Josias.

- Olha! Eu sou a favor da gente fazer alguma agitação. Agora me lembro de outro caso, há uns dois anos, em que uma mulher foi atropelada na rua enquanto varria, e a COVAT abafou o caso e depois a mulher foi demitida. – disse Varre Tudo que naquele momento já estava nervoso com todos os acontecimentos.

- E para piorar, nosso salário está muito baixo. Poxa! No meu caso que tenho mãe e irmã para sustentar, está ficando cada vez mais complicado. – disse Josias.

- Ih Josias! E o meu namorado, quer que eu saia da COVAT para arranjar um lugar em que eu ganhe mais. – retrucou Shirly.

- Bem, diante desse quadro em que a gente se encontra, más condições de trabalho e baixos salários, eu sou a favor que a gente entre em estado de greve. – disse Abelhão, que já tinha na família, trabalhadores sindicalizados e mais conscientes com essa história de direitos trabalhistas.

- Mas, e como se faz uma greve? – perguntou ingênuo Varre Tudo.

- Olha Varre! – respondeu Abelhão. – Não é uma coisa muito simples, exige muito envolvimento, tem que participar de reuniões, definir um plano de ação, colocar no papel as nossas reivindicações, ter um diálogo aberto com os patrões, enfim, é uma coisa de envolvimento mesmo.

- Nossa Abelhão! Onde tu aprendeu tanta coisa, até parece aqueles intelectuais da faculdade... hehehe. – brincou Shirley.

- Não isso que tu falou Shirley, é que quando eu era criança meu tio sempre me levava nessas assembléias e eu convivi com isso. – explicou Abelhão.

- Ah! – disse em coro os amigos.

- Mas então, por onde vamos começar? – falou Varre Tudo.

- Parando de trabalhar. – disse Josias, meio irônico.

- Sim, mas acho interessante a gente começar a nossa greve levantando uma pauta de reivindicações, tomando como base esse acidente com o Júnior e relembrando os fatos chocantes da história da COVAT. – comentou Abelhão.

- Isso mesmo Abelhão. Gostei da idéia. – falou Varre Tudo já puxando um pedaço de papel da mochila e uma caneta. – vou escrever aqui as nossas reivindicações, depois a gente passa a limpo. – disse Varre Tudo.
Varre Tudo começou a listar algumas prioridades para a categoria de varredor, capinador e coletor de lixo da COVAT. Ele foi listando em voz alta, com a ajuda dos amigos.

- Primeiro ponto: aumento real nos salários de 15%

- Segundo ponto: insalubridade para todos os trabalhadores com direito a atendimento médico de urgência.

- Terceiro ponto – diz aí dona Arzelina. – falou Varre Tudo.

- Terceiro ponto – disse Arzelina. – eu acho que é uma aposentadoria digna. Como se diz mesmo Abelhão? Plano de quê?

- Plano de carreira – explicou Abelhão.

- Isso mesmo! Anota aí Varre Tudo. Terceiro ponto: plano de carreira para os aposentados.

- Quarto ponto: auxílio creche! – disse Shirley. – ano que vem pretendo ter um bebê...

- Quinto ponto: auxílio alimentação de 5% todo o mês. – disse Abelhão. – por que a gente tem que comprar comida, né?

- Sexto ponto: não descontar do salário os dias de chuva. Vocês viram que está rolando uma história para descontar os dias não trabalhados em função da chuva. A gente não tem culpa. – disse Varre Tudo, sempre informado.

- Sétimo ponto: o pagamento de hora extra e não banco de horas, como eles fazem hoje. – contribuiu Josias.

- Bem pessoal, acho que era isso. Será que tem mais alguma coisa? – disse Abelhão.

- Ah, acho que por enquanto não. – disse Varre.

- Escuta Varre, já que você começou a escrever, passa a limpo isso, com letra bonita e amanhã a gente faz xerox e escolhe uma comissão para falar com a direção da COVAT. - Certo! Deixa comigo. A partir de amanhã, Nova Rita Santa vai começar a tratar melhor quem trabalha com o lixo. Agora é greve! – concluiu Varre Tudo.

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

Episódio 26


Junior ouvia um murmúrio e não compreendia nada. Não enxergava nada, via apenas a escuridão. Tinha a sensação de que seu corpo flutuava. Não conseguia mover-se. Abriu os olhos lentamente. A visão fez um degradê. Do preto para o cinza. Do cinza para uma cena nublada. Podia reconhecer a sala branca de um hospital e muita gente ao seu redor, explicando as conversas. Junior consegue erguer a cabeça e lá estão seus amigos. Abelhão, Verre Tudo, Shirley, Josias, Magali e até dona Arzelina.
- Mal saí do hospital, Junior, já tive que voltar! - brincou Dona Arzelina.
Sob o lençol, deitado na cama do hospital, Junior não conseguia lembrar-se do acidente, não enxergava, nem sentia o seu braço, e perguntou.
- O que é que eu tô fazendo aqui, pessoal?
O amigo Varre Tudo deu um sorriso leve, não sabia como contar o amigo.
- Você teve um ferimento muito grave...
Nessa hora, ouvem uma discussão que vem do corredor do hospital. Algumas mulheres gritam. Varre Tudo olha para os amigos com uma expressão indagadora.
- Nossa! Hospital é local de silêncio! O que é isso?
Shirley levanta, abre a porta da sala para ver o que está acontecendo e ouve:
- Como assim, teu namorado!? Ele veio lá na minha casa ontem!
Shirley compreendeu. Junior não tinha apenas fama de namorador e, agora, todas as suas paqueras se encontravam. Eram quatro. A varredora resolve chamar a atenção:
- Meninas! Vocês estão num hospital! Silêncio, se não, vão mandar todos nós embora. O Junior tá mal! Respeito! E como deixaram subir tanta gente assim num quarto só.
- A gente pediu a chave do quarto errado, sem querer – disse rindo uma delas.
Shirley estava revoltada. Não acreditava que as meninas estavam rindo e pensando tanta baboseira, enquanto seu amigo estava com um sério problema.
- Façam o favor de descer! Depois que alguém sair daqui vocês sobem! Uma por vez. Se quiserem brigar, problema de vocês!
As quatro fizeram cara feia para Shirley, mas se direcionaram até o elevador.
Os amigos, dentro da sala, estavam em silêncio tentando compreender o que acontecia, quando Shirley entrou.
- Xi! Me dei mal! – disse Junior.
Varre Tudo ia falar para o amigo o que havia acontecido quando uma enfermeira chegou.
- Pessoal, o Junior precisa descansar. Que barulho é esse?
- Não era aqui não – explicou Shirley – eram umas garotas malucas que estavam no corredor.
A enfermeira voltou-se para Junior:
- Como está, rapaz?
- Não sinto nada – disse Junior.
- Você lembra do acidente?
- Acidente? Mas... Droga! – reclamou o rapaz lembrando do que acontecera – como está minha mão?
- Fique calmo! Você ainda está sob o efeito da anestesia. Mas, tivemos que amputar a sua mão, sinto muito. Não tínhamos o que fazer.
- Mas e agora como vou trabalhar!? – Pediu Junior num choro desesperado.
- Por favor, não se preocupe com isso agora. Você precisa descansar e manter-se calmo. Tome isso – indicou a enfermeira que trazia uma cápsula de remédio – assim você consegue dormir até que se recupere.
Junior tomou o comprimido e alguns minutos depois estava dormindo. Os amigos estavam indignados. Saíram da sala quietos e tristes.
Fora do hospital encontraram as “namoradas” do rapaz conversando passivamente. Shirley pediu:
- Vocês vão subir agora?
- Não. Decidimos que nenhuma de nós vai ir ainda atrás dele – esclareceu uma delas.
Shirley não ligou muito para o que a menina disse, pois estava preocupada com Junior e voltou a falar com os colegas.
- A gente precisa fazer alguma coisa. Não podemos deixar nosso amigo nessa situação. Que tristeza, gente! – disse Shirley suspirando.
- Pois é... – falou Varre Tudo – eu estou pensando que a gente pode ir até o escritório da COVAT e falar com alguém.
- Bah! O Junior foi lá hoje! Por que ele tinha que pedir pra trabalhar na coleta!? - reclamou Abelhão - Isso não precisava ter acontecido com ele.
- Não sei como colocam alguém trabalhar na coleta, sem nenhuma instrução! – refletia Dona Arzelina – O rapaz não tinha experiência. Ele devia ter ficado um tempo em treinamento. Isso é coisa muito séria. Irresponsabilidade de quem deixou ele trabalhar na coleta!

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Episódio 25


Enquanto Dona Arzelina fazia aquela inesperada revelação para os amigos, Junior seguia o mais rápido possível em direção ao escritório da COVAT. O varredor estava determinado a arrumar uma vaga na coleta do lixo, já que há dias a chuva o impedia de trabalhar e ganhar pelo seu serviço. Estava realmente preocupado com a situação, pois sabia que o tempo chuvoso afetaria negativamente seu salário.
Assim que entrou no escritório, Junior foi em direção ao balcão de atendimento aos funcionários. Havia uma secretária ao telefone, e, por isso, se obrigou a sentar em uma das cadeiras estofadas da sala de espera. Estava bastante inquieto e ansioso. Não via a hora de conseguir um modo de recuperar as horas de trabalho perdidas e de aumentar seu salário. Tão logo a secretária desligou o telefone, Junior levantou-se e, a passos largos, alcançou o balcão. Cumprimentou a secretária e disse:
– Me chamo Antônio Carlos Junior, sou varredor. Queria saber se, por acaso, há alguma vaga para trabalhar como coletor durante esses dias de chuva, em que não podemos varrer as ruas da cidade. Seria possível? – indagou Junior.
– Deixe-me ver se entendi direito. – disse a secretária tentando compreender o pedido de Junior. E continuou: – Você é varredor da COVAT e gostaria de trocar sua função dentro da empresa para coletor. É isso? – perguntou ela.
– Não exatamente. Na verdade não quero trocar de função, gosto de trabalhar como varredor. O que acontece é que, nesses dias em que tá chovendo, assim como hoje, nós varredores não podemos trabalhar e, no final do mês, essas horas são descontadas do nosso salário. Daí, já viu, né. Se chove bastante a gente recebe pouco dinheiro e não consegue pagar as contas do mês. Por isso queria fazer algumas horas, nem que sejam temporárias, na coleta do lixo. Assim garanto o dinheiro no final do mês. – explicou-se Junior.
– Tá certo. – concordou a secretária, balançando a cabeça positivamente. – Vejamos o que posso fazer por você.
A secretária analisou algumas folhas de papel que estavam à sua frente, verificou o sistema com a relação dos funcionários no computador e voltou a falar com Junior:
– Bom, há uma maneira de você fazer algumas horas adicionais na coleta para compensar às que não trabalhou como varredor. O que posso fazer é inseri-lo no sistema de folgas, ou seja, você vai ser colocado na coleta sempre que um dos coletores estiver de folga. O que acha?
– Acho ótimo! – exclamou Junior. – E quando posso começar? – perguntou ansioso.
– Pelo visto você está com pressa. Só um momento que vou conferir as folgas dos funcionários aqui no sistema. – disse a secretária enquanto olhava para a tela do computador. Ah, veja só! Se você quiser já pode começar hoje à tarde. Tem um caminhão que vai sair da COVAT daqui uns 15 minutinhos para fazer a coleta em alguns bairros da cidade. Se você conseguir se arrumar a tempo, já pode sair junto com eles.
– Opa! Que beleza! Então vou começar agora mesmo! Só preciso colocar o uniforme! – disse Junior, realizado com a possibilidade de reaver parte de seu salário.
Ele agradeceu à secretária pela ajuda e seguiu em direção ao vestiário da empresa a fim de colocar o uniforme. Em poucos minutos estava pronto para iniciar o trabalho junto aos outros rapazes que já embarcavam no caminhão. Quando chegou ao pátio da COVAT, apresentou-se aos novos colegas de serviço e pendurou-se no caminhão, que em seguida partiu do local. No caminho, Junior conversava com os outros coletores e explicava a eles sua situação.
– Daí nos dias em que chove, como hoje, por exemplo, a gente fica sem trabalhar e também sem receber. E agora no início da primavera costuma sempre chover bastante...aí, recebemos um pingo de salário no final do mês. Por isso que optei por fazer essas horas aqui na coleta. – relatou Junior.
– Mas e me diz uma coisa, camarada...tu tem experiência na coleta? Alguma vez já trabalhou assim no caminhão, como agora? – perguntou um dos coletores com quem Junior conversava.
– Na verdade não tenho muita experiência não, só trabalhei como coletor por um mês, assim que entrei para a COVAT. Logo depois me tornei varredor. – respondeu Junior. – Mas acho que não tem mistério fazer a coleta. – completou.
– É, não tem mistério, mas tem que ser rápido, ter fôlego e um bom preparo físico para acompanhar o caminhão. Não é mole, não! Mas só porque hoje é teu primeiro dia a gente te dá uma ajudinha se for preciso. – disse o coletor em meio a gargalhadas.
Começaram a coleta pelo bairro Olga Jandira Vagner. Junior esforçava-se para acompanhar o ritmo do grupo de coletores e não demorou muito para que se sentisse cansado de subir e descer do caminhão. Além disso, era necessário ser rápido e preciso ao arremessar os sacos de lixo para dentro do caminhão, que em segundos eram triturados pelo compactador. Numa das vezes em que embarcou de volta para então jogar os sacos de lixo dentro do veículo, Junior enlaçou, acidentalmente, o nó de umas das sacolas nos dedos das mãos. Sem perceber o que havia acontecido, lançou os embrulhos de lixo em direção ao compactador. A última sacola, no entanto, teimou em não se desvencilhar de seus dedos e, quando menos esperava, Junior teve a mão puxada pelo mecanismo de compressão do caminhão. Sua mão ficou presa, sem que ele conseguisse movê-la. O movimento do compactador esmagou sua mão, fazendo escorrer-lhe sangue pelo braço. Junior soltou um grito de pavor e dor e, em questão de segundos, estava inconsciente.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

Episódio 24


Juseppe não alcançou Jaciara. Confuso, entrou no carro e dirigiu pela cidade, sem rumo, até o anoitecer. Enquanto a cidade dormia, Juseppe pensava no presente e no futuro, avaliando se valeria a pena arriscar o amor de Jaciara por simples egoísmo. Em casa, adormeceu, num sono sem sonhos nem pesadelos.
A manhã seguinte começou nublada. Sem saber se choveria ou não, Capitão do Mato passou na casa do pessoal da COVAT, como de costume, e mal entraram todos na Kombi, uma chuva densa encharcou a cidade.
- Bah, galera, e agora? Não vai dar pra trabalhar! Mas que droga! Cada vez menos trabalho, cada vez menos salário. Que $%#@$%! – irritou-se Junior.
- Opaaa! Têm moças aqui, ô cabeção! Olha essa boca suja. – riu Abelhão.
- Respeito é bom e conserva os dentes, seu besta. – disse Capitão do Mato, acabando com a farra.
Os colegas se entreolharam e não disseram nada. Shirley discou para seu Pedroca, e enquanto esperava a ligação, contou a idéia que tivera aos amigos.
- Vou perguntar pro Seu Pedroca se o Capitão pode nos deixar no hospital, já que a Dona Arzelina tá por lá. Quem sabe já conseguimos a alta dela hoje de manhã e passamos o dia com ela. Que acham? – indagou Shirley.
- Mas, ah guria! Tu é um gênio. Assim, se o Seu Pedroca concordar, o Capitão não pode chiar. – sussurrou Josias.
Explicado tudo a Seu Pedroca, ele concordou prontamente e acrescentou:
- Diz pro Capitão deixar vocês lá e esperar. Se a Dona Arzelina tiver alta, ele que leve vocês pra casa. Diz pra ele esperar, hein, fui eu que mandei! – explicou Seu Pedroca.
Acertados os detalhes com Seu Pedroca e Capitão do Mato, o motorista estacionou em frente ao hospital e prometeu esperar. Mal o pessoal desceu da Kombi, ele arrancou cantando os pneus.
- Mas é um tratante! Estúpido! Cachorro! Volta aquiiiiii! – gritou Shirley, indignada.
- Psiu, silêncio, isto é um hospital. Deixa ele. Se era pra fazer de má vontade, melhor ir embora. A gente vai depois de táxi. – sentenciou Varre Tudo.
- Hahaha, o Varre tá com medo que o Capitão seqüestre a gente. – brincou Abelhão, lembrando-se do episódio da prefeitura. Todos riram enquanto se encaminhavam para o quarto de Dona Arzelina.
- Surpresaaaa!!! - gritaram, abraçando Dona Arzelina.
- Meus filhos, que bom ver vocês. Que maravilha. Sabia que a moça recém me disse que posso ter alta? Bons ventos trazem vocês! – sorriu.
- Mas que beleza! Então vamos levar a senhora pra casa já, já. Vamos todos pra lá passar o dia, cuidamos de tudo pra senhora, não se preocupe. – disse Josias.
Dona Arzelina, com lágrimas nos olhos, agradeceu por tudo e assentiu com a cabeça. Depois de assinar os documentos do hospital, Varre Tudo andou na direção do grupo, mas Junior puxou-a pelo braço. Disse baixinho:
- Olha, não vou pra lá com vocês. Preciso passar no escritório da COVAT, tô apertado de grana, acho que vou pra coleta. A varrição não tá rendendo muito pra mim, não. Esses dias de chuva me matam!
- Bem, tu que sabe! Mas conversamos depois sobre isso, não quero deixar Dona Arzelina esperando. Boa sorte lá guri, te cuida hein!
Junior acenou e saiu. Varre Tudo encontrou com o restante do grupo e contou o porquê da ausência de Junior. Entraram no táxi e logo chegaram à casa de Dona Arzelina. Desceram e mais que depressa apareceu Magali, que era vizinha de Dona Arzelina, para ajudar com a organização da casa. Varre Tudo corou quando viu a moça, e ela lhe deu um abraço apertado, deixando um pouco de seu perfume na camisa dele.
Assim que acomodaram Dona Arzelina, ela agradeceu por tudo. Depois de ser questionada por Magali sobre o acidente, começou a falar o que lembrava. Após um breve relato, Dona Arzelina deu um pulo na cama. Lembrou-se de algo muito importante, mas que ainda não contara a ninguém.
- Eu não caí sozinha. Alguém bateu na minha cabeça. Um homem de preto! – falou, assustada, antes de embaraçar-se com as próprias palavras e começar a chorar.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

Episódio 23


Varre Tudo ficou um longo tempo sentado. Ele não estava com medo da macumba, do fantoche nem mesmo do sonho. Respeitava todas as crenças e religiões, mas não acreditava em magia negra. Só estava impressionado com as atitudes suspeitas de Juseppe e surpreso com sua própria reação.
- Eu sempre encarei tudo de frente! Chega! Vou acabar de vez com essa história! – esbravejou, dando um soco na cama.
Ele guardou a caixa cuidadosamente dentro do guarda-roupa. Seria a primeira prova que ele iria usar contra as pessoas que queriam lhe fazer mal. Terminou de se vestir e foi esperar a Kombi. O Capitão chegou e, quando eles estavam percorrendo o centro da cidade, passaram por Juseppe. Ele caminhava apressado com as mãos nos bolsos. Varre Tudo ficou observando e começou a planejar como iria desmascarar o guarda, sem magoar Jaciara. O rapaz passou a manhã toda varrendo o parque silenciosamente. Shirley e Josias até tentaram conversar com ele, mas mesmo assim Varre apenas abanava com a cabeça. Ele, enfim, tinha tomado uma decisão. Depois do almoço, Varre Tudo e os amigos foram para a praça. Mais uma vez eles avistaram Juseppe de longe. Ele atravessou a praça, entrou no carro e passou próximo a eles. Quando se aproximou, baixou o vidro e disse em tom de deboche e com uma expressão sinistra no rosto:
- Te cuida, Vassourinha! Ouvi dizer por aí que tu anda com azar...De repente, tu cai e quebra as pernas...
Varre Tudo sorriu e aquele sorriso fez o sangue de Juseppe gelar.
- Será que ele sabe? Droga! – pensou ele, enquanto acelerava, passando o sinal vermelho.
Juseppe estava atordoado e suava frio. Ele tinha que resolver o que fazer. Aproveitou a folga para ir até a Gráfica Papagaio sem levantar suspeitas. Estacionou em frente à gráfica, entrou e acenou para Maurício. O guarda se dirigiu discretamente para os fundos da gráfica, que estava lotada naquela tarde. Cabelera, que estava colocando três aves raras nas gaiolas, virou-se e cumprimentou o amigo.
- E aí, meu? Resolveu aquela parada? – indagou Cabelera.
- Resolvi, nada! Fiz tudo isso e agora aquela droga de falsificação não adianta! Tive na prefeitura hoje e o Vassourinha já teve lá – disse ele, chutando a porta.
- E agora? Eu te avisei! Entrou na idéia do Maurício! Dá nisso, viu! Mas vê cá. Lembra do cara da responsa? Me ligou e disse que traz a mercadoria ainda essa semana! Sacou? Te anima, é grana certa – disse ele, piscando.
Maurício chamou Cabelera, que voltou apressado.
- A Jaciara tá aí, Juseppe! Sai por aqui, porque ela já deve ter visto o teu carro, meu!
Cabelera abriu a porta lateral para o amigo, mas quando ele estava passando em frente à gráfica para entrar no carro, Jaciara abriu a porta.
- Juseppe! – gritou ela nervosa.
- Oi, amor! O que tá fazendo aqui, minha linda? – disse, tentando parecer surpreso.
- Eu vim fazer umas cópias, mas estou tão angustiada, que acabei esquecendo os papéis lá na reciclagem.
- Mas veio fazer cópias aqui tão...
Jaciara interrompeu o namorado. Ela estava muito nervosa e agitada.
- Olha só, Juseppe, não interessa o que eu vim fazer aqui! Nós precisamos conversar sobre a gente. Não nos vemos mais. Esse fim de semana inventou outra desculpa pra não me ver. O que está acontecendo? – perguntou irritada.
Jaciara estava triste e decepcionada. Ela queria acreditar que a tristeza e o aperto no peito eram apenas saudades do namorado, que não lhe dava mais a atenção de antes. Mas ela sabia que esse não era o motivo. Não conseguia aceitar que tivesse passado quatro anos com alguém que na verdade não conhecia. Jaciara se sentia perdida em um labirinto de emoções. Juseppe era seu namorado, merecia confiança, respeito e compreensão, mas ela não sabia o que fazer. Se ele realmente tivesse tentado prejudicar Varre, iria provar que era mau caráter, e Jaciara não conseguiria dar apoio e ficar com alguém assim. A moça estava confusa e assustada demais e sentia vontade de sair correndo, esquecer tudo.
- Calma, Jaci! Amor! Eu posso explicar. – disse ele gaguejando.
Pela primeira vez Juseppe compreendeu o quanto podia perder com toda essa história. Ele não podia deixar que ela descobrisse seus planos. Ele achava que se Jaciara, soubesse iria correndo para os braços de Varre Tudo. E isso Juseppe jamais iria aceitar.
- Fala de uma vez! Nós somos namorados e tu nunca me fala nada, não divide problemas, não me conta mais aonde vai, nem sequer quer saber se saí com alguém ou se fiquei em casa! Pra ti tanto faz! – gritou ela.
Jaciara suspirou e tentou se controlar. Ela não queria chorar, mas lágrimas teimosas escorriam por sua face. O namorado a olhava em silêncio. Juseppe nunca a tinha visto tão braba e irritada. Jaciara era uma moça calma, alegre e gentil, mas agora ele não sabia o que fazer. O silêncio entre os dois era como um abismo. Jaciara sentia como se estivesse perdendo o namorado. Ela tentava alcançá-lo, mas ele escapava entre seus dedos.
- Então? Como sempre, tu não vai falar nada? Quer saber, nem sei por que estamos juntos. Tu não se importa! Tchau!
Jaciara atravessou a rua correndo. E Juseppe ficou lá olhando a namorada. Ele estava vermelho de raiva e vergonha, enquanto gritava para que ela lhe desse mais uma chance.

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Episódio 22


Depois de mais uma tarde de trabalho, Varre Tudo foi para casa. Eram cinco horas da manhã quando ele percebeu que foi arrancado da cama por seis braços.
- Mas o que é isso? – indagou Varre Tudo – O que estão fazendo comigo? Para onde estão me levando?
De repente, um saco preto impedia a visão de Varre Tudo e ele se debatia, mas os braços eram mais fortes.
- Que cheiro forte é esse? Parece enxofre. Onde estou?
- Fique quieto, Varre Tudo. Logo isso vai terminar, e como você é um rapaz muito bom, corajoso e amigo, vai entrar no reino dos céus.
Hehehehe – disse uma voz grave.
- Nossa! Mas quem é você? – indagou Varre Tudo.
Foi quando um homem de preto retirou o saco e Varre Tudo conseguiu respirar com maior facilidade. Viu que estava em um lugar escuro e que não conhecia. Do seu lado, estava o vodu que lhe enviaram há alguns dias e do qual nem lembrava mais. De repente, ensacaram sua cabeça mais uma vez e enrolaram seu pescoço em uma corda.
- Não! – gritava Varre Tudo – O que eu fiz? Por que querem me matar?
- Você está fazendo o que não deve. Fique na sua, Vassourinha!
- Juseppe! Qual a sua, cara? Me tira daqui, vamos conversar.
Varre Tudo sentiu uma dor forte no pescoço quando...
- Trim!Trim!Trim!. Era o despertador. Ele acordou assustado. De um pulo, sentou na cama, estava todo molhado de suor.
- Nossa! Tive um pesadelo! Por que isso agora? – perguntou angustiado.
- E aquele vodu? Espera, ele deve estar aqui no meu quarto ainda.
E Varre Tudo começou a vasculhar todo o quarto, em busca da caixa que recebera com o vodu dentro. Atrás da cama, encontrou a caixa.
- Deixa eu ver, deixa eu ver. – pensava ele. – Aqui! – exclamou.
- “Na árvore do enforcado cuidado com a corda” – leu Varre Tudo. Mas o que significa isso?
Meio atordoado, Varre Tudo jogou a caixa em cima da cama e ficou pensando no sonho e no que poderia significar aquela frase.

sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Episódio 21


Com o chapéu preto nas mãos, Varre Tudo encontra os amigos.
- Nossa! Mas terminou rápido mesmo, hoje – surpreende-se Josias ao ver o amigo retornando.
- Não, não terminei, não... É que... Alguém tá mexendo sério comigo. Sabe o vulto da Árvore do Enforcado? Acho que ele é de carne e osso...
- Ih... – suspeitou Shirey – minha vó sempre disse que a gente tem que ter mais medo dos vivos do que dos mortos.
- Hoje vi alguma coisa de novo e, quando me aproximei da árvore, encontrei esse chapéu – explicou o varredor.
- Ei! Deixa eu ver esse chapéu, Varre? - pede Josias.
O rapaz examina o acessório. Olhá de cá. Olha de lá. Observa:
- Lembra daquele dia em que o Capitão do Mato falou com um cara todo de preto?
- Hã! - se espanta Shirley.
- Ele usava um chapéu muito parecido com esse... - concluiu Josias.
- Putz! Caramba – esbravejou Varre Tudo – E pior... eu tenho agora, ligando os fatos, a impressão de que foi o mesmo cara que me assaltou. Que saco! Tô ficando cansado e bem preocupado com toda essa história. Será que tudo que aconteceu comigo tem uma ligação?
- Varre, começa a tomar cuidado – aconselha Shirley – ,mas... eu não entendo como alguém pode querer fazer algum mal pra um guri boa gente como tu.
- Bah... Mas e o Capitão do Mato? Será que ele tem mesmo relação com todo esse rolo? - questiona Varre Tudo – ah! Eu nem contei pra vocês... Lembram o dia em que estourou o cano na prefeitura? Vocês nem tinham tirado as vassouras da Kombi e ele arrancou. Ele disse que ia me levar pra algum lugar. Minhas pernas tremiam enquanto ele pisava fundo no acelerador! Pulei da Kombi e voltei pra prefeitura, mas nem consegui falar com vocês.
- Ué! - estranhou Josias – mas onde ele ia te levar?
- Não quis me dizer. Não sei o porquê. Mas entendi que ele queria me usar de cúmplice pra alguma coisa.
- Que esquisito! Olha só, Varre, a coisa tá ficando feia! Tu não varre mais sozinho lá no Enforcado. Troca comigo. Fica aqui com Josias que acho que tu fica mais seguro.
- Bah, Shirley, é melhor assim. Obrigado. Deixei as minhas coisas lá – disse Varre Tudo.
Continuaram o serviço até o meio-dia, quando se encontraram na sala, ou melhor, no que sobrou dela. Abelhão e Junior estavam sentados em um sofá velho, que havia sobrado do incêndio. A cara dos dois não era nada boa.
- Pô, Abelhão! Tu andou fazendo piada de mau gosto, foi? - perguntou Varre Tudo.
- Não - disse o Abelhão – tu não viu teu salário?
- Vi, sim, mas é que esse mês choveu muito. A gente sempre fica prejudicado nesses dias.
- Ah... eu tô achando muito estranho. Esse mês não passaram minha relação de horas pra eu conferir. Tô desconfiado – argumentou Junior.
- Imagina, ninguém da companhia vai roubar da gente. Foi culpa do mau tempo mesmo. Não vai ser fácil esse mês – lamentou Varre Tudo –, pagando o aluguel, sobra menos ainda – o varredor ficou pensativo enquanto os amigos estavam em silêncio – A gente podia pensar em alguma forma que nos auxiliasse nesses dias de chuva e vento. A COVAT deve precisar de algum outro serviço em que a chuva não seja um empecilho. Vou pensar em alguma coisa, depois a gente faz uma proposta.
- Sim! Tu sempre tem boas idéias. É esperto! Mas, Varre, eu tô dizendo, acho que tem alguma coisa errada com nossos horários – insistiu Junior.
Varre Tudo desviou do assunto:
- Bom, eu tô com fome! Vamos almoçar?
Os cinco saíram e comentaram sobre o estado de Dona Arzelina. Ela começava a se recuperar.