terça-feira, 9 de outubro de 2007

Episódio 23


Varre Tudo ficou um longo tempo sentado. Ele não estava com medo da macumba, do fantoche nem mesmo do sonho. Respeitava todas as crenças e religiões, mas não acreditava em magia negra. Só estava impressionado com as atitudes suspeitas de Juseppe e surpreso com sua própria reação.
- Eu sempre encarei tudo de frente! Chega! Vou acabar de vez com essa história! – esbravejou, dando um soco na cama.
Ele guardou a caixa cuidadosamente dentro do guarda-roupa. Seria a primeira prova que ele iria usar contra as pessoas que queriam lhe fazer mal. Terminou de se vestir e foi esperar a Kombi. O Capitão chegou e, quando eles estavam percorrendo o centro da cidade, passaram por Juseppe. Ele caminhava apressado com as mãos nos bolsos. Varre Tudo ficou observando e começou a planejar como iria desmascarar o guarda, sem magoar Jaciara. O rapaz passou a manhã toda varrendo o parque silenciosamente. Shirley e Josias até tentaram conversar com ele, mas mesmo assim Varre apenas abanava com a cabeça. Ele, enfim, tinha tomado uma decisão. Depois do almoço, Varre Tudo e os amigos foram para a praça. Mais uma vez eles avistaram Juseppe de longe. Ele atravessou a praça, entrou no carro e passou próximo a eles. Quando se aproximou, baixou o vidro e disse em tom de deboche e com uma expressão sinistra no rosto:
- Te cuida, Vassourinha! Ouvi dizer por aí que tu anda com azar...De repente, tu cai e quebra as pernas...
Varre Tudo sorriu e aquele sorriso fez o sangue de Juseppe gelar.
- Será que ele sabe? Droga! – pensou ele, enquanto acelerava, passando o sinal vermelho.
Juseppe estava atordoado e suava frio. Ele tinha que resolver o que fazer. Aproveitou a folga para ir até a Gráfica Papagaio sem levantar suspeitas. Estacionou em frente à gráfica, entrou e acenou para Maurício. O guarda se dirigiu discretamente para os fundos da gráfica, que estava lotada naquela tarde. Cabelera, que estava colocando três aves raras nas gaiolas, virou-se e cumprimentou o amigo.
- E aí, meu? Resolveu aquela parada? – indagou Cabelera.
- Resolvi, nada! Fiz tudo isso e agora aquela droga de falsificação não adianta! Tive na prefeitura hoje e o Vassourinha já teve lá – disse ele, chutando a porta.
- E agora? Eu te avisei! Entrou na idéia do Maurício! Dá nisso, viu! Mas vê cá. Lembra do cara da responsa? Me ligou e disse que traz a mercadoria ainda essa semana! Sacou? Te anima, é grana certa – disse ele, piscando.
Maurício chamou Cabelera, que voltou apressado.
- A Jaciara tá aí, Juseppe! Sai por aqui, porque ela já deve ter visto o teu carro, meu!
Cabelera abriu a porta lateral para o amigo, mas quando ele estava passando em frente à gráfica para entrar no carro, Jaciara abriu a porta.
- Juseppe! – gritou ela nervosa.
- Oi, amor! O que tá fazendo aqui, minha linda? – disse, tentando parecer surpreso.
- Eu vim fazer umas cópias, mas estou tão angustiada, que acabei esquecendo os papéis lá na reciclagem.
- Mas veio fazer cópias aqui tão...
Jaciara interrompeu o namorado. Ela estava muito nervosa e agitada.
- Olha só, Juseppe, não interessa o que eu vim fazer aqui! Nós precisamos conversar sobre a gente. Não nos vemos mais. Esse fim de semana inventou outra desculpa pra não me ver. O que está acontecendo? – perguntou irritada.
Jaciara estava triste e decepcionada. Ela queria acreditar que a tristeza e o aperto no peito eram apenas saudades do namorado, que não lhe dava mais a atenção de antes. Mas ela sabia que esse não era o motivo. Não conseguia aceitar que tivesse passado quatro anos com alguém que na verdade não conhecia. Jaciara se sentia perdida em um labirinto de emoções. Juseppe era seu namorado, merecia confiança, respeito e compreensão, mas ela não sabia o que fazer. Se ele realmente tivesse tentado prejudicar Varre, iria provar que era mau caráter, e Jaciara não conseguiria dar apoio e ficar com alguém assim. A moça estava confusa e assustada demais e sentia vontade de sair correndo, esquecer tudo.
- Calma, Jaci! Amor! Eu posso explicar. – disse ele gaguejando.
Pela primeira vez Juseppe compreendeu o quanto podia perder com toda essa história. Ele não podia deixar que ela descobrisse seus planos. Ele achava que se Jaciara, soubesse iria correndo para os braços de Varre Tudo. E isso Juseppe jamais iria aceitar.
- Fala de uma vez! Nós somos namorados e tu nunca me fala nada, não divide problemas, não me conta mais aonde vai, nem sequer quer saber se saí com alguém ou se fiquei em casa! Pra ti tanto faz! – gritou ela.
Jaciara suspirou e tentou se controlar. Ela não queria chorar, mas lágrimas teimosas escorriam por sua face. O namorado a olhava em silêncio. Juseppe nunca a tinha visto tão braba e irritada. Jaciara era uma moça calma, alegre e gentil, mas agora ele não sabia o que fazer. O silêncio entre os dois era como um abismo. Jaciara sentia como se estivesse perdendo o namorado. Ela tentava alcançá-lo, mas ele escapava entre seus dedos.
- Então? Como sempre, tu não vai falar nada? Quer saber, nem sei por que estamos juntos. Tu não se importa! Tchau!
Jaciara atravessou a rua correndo. E Juseppe ficou lá olhando a namorada. Ele estava vermelho de raiva e vergonha, enquanto gritava para que ela lhe desse mais uma chance.

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