quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Episódio 34


A população estava perplexa com os acontecimentos da última semana. Nunca Nova Rita Santa andara tão agitada, com greves, tráfico, atentados. A população estava assustada. Enquanto Shirley e Varre Tudo conversavam, tocou o celular dela: era Seu Pedroca, avisando que na manhã seguinte haveria uma reunião às 7h30min na Prefeitura. Os colegas comemoraram a ligação, e ficaram imaginando qual seria a nova proposta para que a greve chegasse ao final.
É sexta-feira, 7h, e Abelhão é liberado pela polícia. Corre para a Prefeitura e quando encontra os colegas fica sabendo da reunião. Varre Tudo indaga sobre a prisão, sobre o bem-estar do colega, mas ele não lhe dá ouvidos: está concentrado com a reunião das 7h30min e quer estar preparado para ouvir as propostas da COVAT.
- Vamos lá. Dessa vez vamos conversar como iguais. Não vou baixar minha cabeça para o prefeito e os outros, somos trabalhadores e devemos lutar por nossos direitos. - diz Abelhão, com os olhos brilhando. - Nossa luta não é somente entre COVAT e funcionários, mas também entre todos os trabalhadores e seus empregadores. - concluiu.
Varre Tudo achou estranho seu primo Jéferson não ter aparecido naquela manhã. Jaciara e os outros até comentaram dia desses o empenho e envolvimento de Jéferson com uma causa que nem lhe diz respeito, e Varre Tudo ficou emocionado com a demonstração de amizade do primo.
A reunião começou e Manuel Vargas mostrava-se abatido. Estava cansado após uma semana de cabo-de-guerra com os trabalhadores. Ficou quieto por um longo tempo, enquanto o resto discutia as propostas de ambos os lados.
Enquanto isso, Juseppe dirige freneticamente. Parece um maluco, com Maurício ao seu lado, também com os olhos vidrados na estrada. No banco de trás está Jéferson, amarrado e amordaçado, em meio a galões de gasolina. Foram os 15 minutos mais demorados da vida de Jéferson, que fora arrancado da cama naquela manhã, sem saber porque. Agora, estava ali, prevendo seu fim, e lembrando do dia em que tentara “enganar” Maurício e Cabelera na gráfica. Fechou os olhos com a esperança de que o pesadelo acabasse logo.
O carro parou e Jéferson foi arrancado de dentro do veículo e jogado no chão, em meio a galinhas, porcos e muita sujeira. Não conhecia aquele lugar, mas percebeu que se tratava de uma chácara. Os olhos encheram-se de terra, a boca seca, o corpo dolorido das amarras. Mal conseguia raciocinar quando levou um chute na barriga, que atingiu o rim. A dor era insuportável. Depois de alguns chutes e baldes d'água, ameaças e agressões, Maurício e Juseppe começaram o interrogatório.
- Tu é muito burro né, meu! Tu achou que a gente não ia descobrir que era tu? Quem mandou tu abrir a matraca, hein? - disse Maurício.
- É cara! Tu pensa o quê? Que mexer com a gente é brincadeira de criança? Agora tu vai sofrer as consequências. E pode abrir a boquinha porque quero saber pra quem tu trabalha. - remendou Juseppe, dando mais um chute em Jéferson.
O jovem cuspia sangue e estava semi-consciente. Não queria falar nada, nem entregar seu primo Varre Tudo, mas quando entrou naquela fria jamais imaginara que a história iria tão longe. Jéferson era estudioso, interessado, não queria morrer ali. Tinha um futuro e sabia que Juseppe e Maurício não estavam nem um pouco interessados nisso. Pensou mais um pouco, entre chutes e tapas, e decidiu contar tudo.
- Eu, eu... - disse Jéferson, com a voz rouca, quase sem forças. - Sou primo do Varre Tudo, eu ajudei ele porque a gente tava desconfiado de vocês. Mas pelo visto a gente tava certo, vocês são uns bandidos mesmo. - disse, e arrependeu-se logo em seguida de suas palavras ao levar mais um chute. Dessa vez, desmaiou de tanta dor.
Juseppe e Maurício entreolharam-se. Sabiam o que fazer. Jogaram Jéferson no banco de trás do carro e dirigiram até o centro da cidade. Atiraram o jovem dentro de um contêiner imundo e espalharam gasolina por todo o lado. Riscaram o fósforo e, “delicadamente”, atiraram o palito sem olhar para trás. Ao longe, avistaram a fumaça e riram.
- Assunto encerrado. - sentenciou Juseppe.
Os conteineres e a sujeira ardiam em brasa. Animais que dormiam junto às lixeiras também logo sentiram as chamas. O fogo se alastrava rapidamente, e os contêineres ardiam ao calor das chamas. O cheiro e a fumaça eram insuportáveis, e a população começou a perceber o incêndio. Em meio à confusão, um jovem acorda, de sobressalto. Era Jéferson, que, por milagre, voltou a si após meia hora desmaiado. Quando se deu conta de onde estava e do que estava acontecendo, reuniu as forças que lhe restavam e se atirou para fora do contêiner, com diversas queimaduras pelo corpo e sem acreditar que conseguira sobreviver.
Ao sair, pessoas o fitavam assustadas. Quando foram lhe prestar ajuda, Jéferson disse:
- Me levem até a prefeitura.
Entrou ao trancos e barrancos, ferido, esfarrapado, na reunião da COVAT. Varre Tudo deu um pulo quando viu o primo e correu ao seu encontro. Jéferson contou rapidamente o acontecido, enquanto o prefeito avisava à polícia e ao Corpo de Bombeiros. Seu Pedroca chamou uma ambulância que levou Jéferson para o hospital. Varre Tudo quis ir com o primo, mas ele negou a companhia. Disse ao primo o que ele deveria fazer, agradeceu a preocupação e se foi, acompanhado da equipe da ambulância.
Varre Tudo parou por um minuto. Prendeu o choro. Recuperou-se do baque, entrou num carro da polícia e rumaram à chacara de Catarina. Ao chegarem ao local, encontraram Maurício, Juseppe, Cabelera, Capitão do Mato e o próprio Catarina. Eles tentaram fugir, mas foram capturados pela polícia. Quando Varre Tudo chegou, os cinco estavam algemados, sentados num canto, enquanto respondiam aos questionamentos dos policiais. Surpreendeu-se ao ver Capitão do Mato ali, mas o susto maior foi quando avistou Catarina.
- Meu Deus, é ele. É ele o cara que me assaltou! É ele, meu Deus! - surpreendeu-se Varre Tudo, ao constatar que ele era, também, o homem que tentava assustá-lo na Árvore do Enforcado no Parque do Sabiás. Varre Tudo estava perdido, desolado com tantas surpresas numa única manhã. Sentiu as pernas tremerem e se deixou cair na cadeira.

Nenhum comentário: